Ficha de Património Imaterial

  • N.º de inventário: INPCI_2022_004
  • Domínio: Práticas sociais, rituais e eventos festivos
  • Categoria: Festividades cíclicas
  • Denominação: Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga
  • Outras denominações: Festas da Semana Santa de Braga; Celebrações Pascais Bracarenses; Semana Santa de Braga
  • Contexto tipológico: A Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga é um conjunto de manifestações sociais de índole religiosa e cultural, que detém raízes da tradição cultual da Igreja Católica em Braga, sendo reveladora de um contexto que proporciona ocorrências singulares na sua expressividade e impacto comunitário.
  • Contexto social:
    Comunidade(s): Leigos da Igreja Catolica Apostolica Romana; União de Freguesias de Maximinos Sé e Cividade; União de Freguesias de S. Lázaro e S. João do Souto; Freguesia de S. Victor; Freguesia de S. Vicente
    Grupo(s): Cabido da Sé de Braga; Santa Casa da Misericórdia de Braga; Irmandade de Santa Cruz; Câmara Municipal de Braga; Entidade de Turismo do Porto e Norte de Portugal; Associação Comercial de Braga; Paróquia de S. Victor; Comissão da Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga
  • Contexto territorial:
    Local: União de Freguesias de Braga (S. Lázaro e S. João do Souto), Freguesia de Braga (S. Victor) e da União de Freguesias de Braga (Maximinos, Sé e Cividade)
    Concelho: Braga
    Distrito: Braga
    País: Portugal
    NUTS: Portugal \ Continente \ Norte \ Cávado
  • Contexto temporal:
    Periodicidade: Anual
    Data(s): Realiza-se entre a Quarta-Feira de Cinzas e o Domingo de Páscoa, sobretudo durante os meses de Fevereiro, Março e Abril, variando a sua ocorrência conforme a definição das festas móveis do calendário.
  • Caracterização síntese:
    A Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga são uma manifestação cíclica que se afirma, no presente, como o mais importante evento do calendário anual do município de Braga, decorrendo entre a Quarta-Feira de Cinzas e o Domingo de Páscoa. A cidade de Braga, como cenário preferencial da vivência da Paixão de Jesus Cristo em Portugal, oferece-nos um dos mais vastos e oportunos repositórios de manifestações associadas à Semana Santa e à celebração pascal. Celebrações enraizadas na comunidade desde que o Cristianismo aqui se implantou no século IV, acabou por obter um particular desenvolvimento através do papel dos seus arcebispos, ordens religiosas e corporações seculares, salientando-se as iniciativas do Arcebispo D. Frei Agostinho de Jesus no final do século XVI. A partir de 1933, com a criação da Comissão da Semana Santa, verificou-se um especial incremento das dinâmicas associadas. Não são apenas as seculares procissões dos Passos (1597) e do Senhor Ecce Homo (1513), completadas nas últimas décadas pela Procissão do Enterro do Senhor (1933) e pela renovada Procissão da Burrinha (1998), que perfazem a imponência da quadra. As ruas vestem-se de roxo e perfumam-se de incenso, tal como os principais templos que continuam a centralizar o exercício de práticas seculares. Na Sé Primaz decorrem as principais celebrações segundo o pendor de um costume litúrgico que reivindica identidade. Nos Congregados desprendem-se as espadas da imagem da Senhora das Dores, pioneira desta devoção em Portugal e propulsora de um peculiar exercício devocional. Em sete igrejas se adora o sepulcro do Senhor, num desafio à contemplação da mais tenebrosa contingência da existência humana. E no domingo estala a alegria! As campainhas ouvem-se ao longe. Os foguetes estalam no ar. As portas das casas abrem-se e exibem a abundância primaveril. O Senhor ressuscitou! Porém, dando cumprimento à Quaresma, especial tempo de preparação para a Páscoa que a Igreja propõe aos cristãos, é proposto um conjunto de ações, de natureza eminentemente cultural ou vinculadas às práticas devocionais deste tempo, que complementa e antecipa a Semana Maior, entre as quais se destaca o Lausperene Quaresmal.
  • Caracterização desenvolvida:
    Abordaremos de forma desenvolvida, como elementos diferenciadores da Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga, as seguintes manifestações: Lausperene Quaresmal Procissão dos Passos Procissão da Burrinha Procissão do Senhor Ecce Homo Procissão do Enterro Rito Bracarense Visita às Sete Igrejas Compasso Pascal LAUSPERENE QUARESMAL: O Lausperene Quaresmal decorre anualmente entre a Quarta-Feira de Cinzas e a Quarta-Feira de Trevas. Decorre ao longo de dois dias em cada igreja, tempo durante o qual o Santíssimo Sacramento está exposto em adoração permanente desde o princípio da manhã até ao fim da tarde, iniciando e encerrando-se diariamente com uma celebração eucarística. São, no total, 23 os templos que acolhem o Lausperene Quaresmal na cidade de Braga: Sé, Seminário, Misericórdia, Penha, Salvador, Santo Adrião, Cividade, Maximinos, Teresinhas, Terceiros, Ferreiros, S. João do Souto, Pópulo, Santa Cruz, Carmo, S. Lázaro, S. Victor, Hospital de S. Marcos, Lapa, Congregados, S. Vicente, Senhora-a-Branca, Conceição. O período de preparação do Lausperene Quaresmal em cada templo decorre durante dois dias, tempo durante o qual se preparam as alfaias necessárias, se compõem os arranjos florais e os castiçais, se preparam as cortinas, colchas, lanternas e outros elementos decorativos utilizados. Para os cristãos bracarenses, esta é uma altura especial do ano, e para as paróquias e confrarias responsáveis pelos templos também se torna um momento privilegiado. As igrejas são decoradas primorosamente com flores, velas e monumentais cortinas, contrastando com a austeridade que os cânones litúrgicos aconselham por estes tempos quaresmais. O trono eucarístico, habitualmente localizado ao centro do altar-mor em forma de tribuna, continua a ser o lugar por excelência da adoração eucarística. A porta principal da igreja é vedada com uma enorme cortina púrpura e, junto à entrada da mesma, acolhem-se as habituais “rebuçadeiras”, que têm o ofício de tentar os fiéis com os tradicionais “rebuçados do Senhor” embrulhados em papéis multicolores. Esta tradição bracarense, impregnada de um âmbito religioso e devocional, também integra uma perspetiva estética, dado que as igrejas da cidade adquirem uma particular beleza durante os dias em que são “visitadas” pelo Lausperene Quaresmal. Entre flores e castiçais, cortinas e luminosidade, muitos templos continuam a optar pela exposição eucarística nas tradicionais tribunas que, em muitos casos, só são exibidas ao público nesta altura do ano. No que diz respeito à tradição oral, muitos bracarenses continuam a referir-se ao Lausperene Quaresmal como “ir ao Senhor”. (Ex: “O Senhor hoje está nos Terceiros!”; “Vou ao Senhor ao Pópulo!”) Entre os exemplares do Património Móvel implicados nesta tradição encontram-se custódias, castiçais em prata ou talha dourada, porcelanas, veludos e cortinas bordadas, colchas, lanternas e outras luminárias. PROCISSÃO DO SENHOR DOS PASSOS: Instituição responsável: Irmandade de Santa Cruz Ano de início: 1597/98 Calendarização: Domingo de Ramos, 17h00 Ponto de partida: Igreja do Seminário (S. Paulo) Ponto de chegada: Igreja de Santa Cruz Percurso: Largo de S. Paulo; rua de S. Paulo; largo Paulo Orósio; rua do Alcaide; largo de Santiago; rua do Anjo; largo Carlos Amarante; largo de Santa Cruz; rua D. Afonso Henriques; rua D. Gonçalo Pereira; rua D. Paio Mendes; avenida S. Miguel-o-Anjo; Campo das Hortas; rua D. Diogo de Sousa; rua do Souto; largo de Barão de S. Martinho; rua de S. Marcos; largo Carlos Amarante. Freguesias: Cividade; S. João do Souto; Sé Distância: 2.200 metros Memória Descritiva: O objetivo da procissão é reconstituir o caminho (os passos) de Jesus Cristo desde o Pretório até ao Calvário, por isso mesmo ao longo do percurso são levantados oito Passos memorando igual número de etapas da Via Sacra. Os andores com as imagens de Nossa Senhora da Soledade e do Senhor dos Passos são inclinados e fazem breve momento de paragem junto de cada um dos Passos. A preparação para a procissão ocorre na véspera do domingo de Ramos quando a imagem do Senhor dos Passos é conduzida processionalmente da Igreja de Santa Cruz para a Igreja do antigo Colégio de S. Paulo, sendo que, no Largo de Santiago, é interpretado por um grupo coral o tradicional Missere e no final realiza-se uma Via Sacra pelas ruas da cidade cumprindo o itinerário dos Passos, pequenos altares levantados em vários pontos do centro histórico onde figuram painéis com momentos da Crucificação de Cristo. No domingo de Ramos, durante a tarde, partindo da Igreja do Colégio a procissão inicia-se percorrendo as ruas da cidade com os tradicionais estandartes da irmandade, inúmeros figurantes entre eles as digníssimas autoridades religiosas sob o pálio, acompanhada pelos seminaristas, guardas do Cabido e umbela basilical. Abrem e encerram o préstito duas bandas filarmónicas. O momento mais emocionante da procissão acontece com o “Encontro” do Senhor dos Passos com a sua Mãe que ocorre quando esta atinge o Largo Carlos Amarante, defronte da Igreja de Santa Cruz, onde é pronunciado o Sermão do Encontro. Neste momento o préstito é interrompido, voltando-se o andor do Senhor dos Passos para a entrada da Igreja de Santa Cruz, aglomerando-se significativa multidão neste espaço urbano. De um lado, a imagem do Senhor dos Passos, reproduzindo a atitude de Cristo caído perante o peso da sua Cruz. Os pés desnudos e sujos, as nódoas sangrentas bem expostas, a cabeça coroada de espinhos, envergando uma túnica lilás, conferem uma tonalidade trágica, de morte, ao cenário. Do outro, Nossa Senhora da Soledade, carregando uma espada, que lhe trespassa a alma, por assistir à morte do seu Filho amado. O Sermão do Encontro é pronunciado, no decorrer do cortejo, aludindo à quarta estação da Via Sacra e fazendo o paralelo emocionado para as mães e os filhos dos nossos dias. As imagens estão frente a frente. O pregador traça o cenário, acordando o contexto. É evocado o momento do encontro entre Jesus e sua Mãe, contextualizado no caminho do Calvário, irrompendo desde o interior do templo o andor de Nossa Senhora da Soledade, que foi reencarnada no ano de 1954. A multidão emociona-se. E Jesus encontra a sua Mãe! Findo este momento, a procissão prossegue pelas ruas de Braga, agora incorporando-se nela o andor da Senhora da Soledade. Em muitos lugares, a procissão inicia-se com o Sermão do Pretório e termina com o Sermão do Calvário, em alusão ao início e final do percurso da Via Sacra. Na frente do cortejo não faltam os estandartes, assinalando a sua passagem com majestade, como noutros tempos acontecia, à passagem de um Rei ou Senhor. Da Procissão dos Passos nunca se ausenta o estandarte com a sigla “S.P.Q.R.”, redução dos vocábulos “Senatus Populusque Romanus”, que significa “o Senado e o povo de Roma”, sinal da autoridade. Todos os elementos figurativos integrados na procissão representam personagens vinculados aos relatos evangélicos da Paixão de Cristo, nomeadamente o Senhor com a Cruz às costas, a Verónica, a Senhora das Dores ou o Centurião. Habitualmente representadas são também as sete dores de Nossa Senhora, com alusão a cada um dos sete episódios que estão associadas a esta devoção. Recordam-se passagens evangélicas da Paixão, trechos do profeta Isaías, e as personagens que marcaram a passagem terrena do Messias. Bem presentes ainda, são os penitentes. No passado, eram estes devotos a preencher o percurso, acompanhando os andores. Hoje reservam-se ao final do cortejo, com ar compenetrado, aludindo às promessas efetuadas ao “Senhor”, ou simplesmente penitenciando-se do seu próprio percurso pecador. Para além dos andores, carregando as imagens do Senhor dos Passos e de Nossa Senhora das Dores ou da Soledade (dependendo se traz as sete espadas ou apenas uma), surge o pálio, debaixo do qual se abriga uma relíquia do Santo Lenho, carregada pelo sacerdote que preside à procissão. Recentemente foram integrados no arranque da procissão representantes das corporações religiosas do Município de Braga que também realizam procissões dos Passos, nomeadamente Celeirós, Real, Figueiredo e Cabreiros. Cada uma das corporações se faz acompanhar de um ou mais guiões dos Passos, célebres pela sua verticalidade. PROCISSÃO DA BURRINHA: Instituição responsável: Paróquia de S. Victor e Junta de Freguesia de S. Victor Ano de início: 1852| 1960| 1998 Calendarização: Quarta-Feira Santa, 21h30 Ponto de partida: Igreja de S. Victor Ponto de chegada: Igreja de S. Victor Percurso: rua de S. Victor; largo da Senhora-a-Branca; avenida Central; largo de S. Francisco; rua dos Capelistas; rua Justino Cruz; rua do Souto; largo de Barão de S. Martinho; avenida Central; largo da Senhora-a-Branca; rua de S. Victor. Freguesias: S. Victor; S. Lázaro; S. João do Souto Distância: 2.500 metros Duração: 120 minutos Número de participantes: 800 Memória Descritiva: A Procissão da Burrinha, designação comum do cortejo bíblico “Vós sereis o meu povo”, é uma iniciativa integrada nas Solenidades da Quaresma e Semana Santa de Braga, que decorre na noite de Quarta-Feira Santa. Organizada pela paróquia de S. Victor, juntamente com a Junta de Freguesia homónima, resulta da mobilização da comunidade vinculada a estas duas entidades. Apesar de uma pré-existência atestada historicamente (Ver Origem/Historial), foi introduzida nas dinâmicas das Solenidades da Quaresma e Semana Santa de Braga a partir de 1998. Pelo facto de não deter o estatuto de cortejo religioso, obedece a uma estruturação centrada em um ideário narrativo e simbólico da história da Salvação. Desde o chamamento de Abraão, passando pela era dos Patriarcas, pela escravidão no Egipto e gesta libertadora de Moisés (prefiguração de Cristo), até à infância de Jesus, incluindo a sua fuga para aquele país com José e Maria com o Menino montada numa burrinha, desfilam, em sucessão cronológica e em verdadeira catequese viva, profetas, reis, figuras eminentes, símbolos e quadros bíblicos do Antigo Testamento. No essencial, assim é figurada a Aliança de Deus com o seu povo — «Vós sereis o meu povo» — e prefigurada a Nova Aliança que será selada com o sangue de Cristo. A procissão desenrola-se ao longo de 22 quadros, devidamente identificados, representativos da narrativa do Antigo e do Novo Testamento. Os figurantes são distribuídos adequando-se em indumentário e adereços ao quadro que pretendem representar. O quadro mais aguardado é o n.º XIX, no qual é apresentada a imagem de Nossa Senhora do Egipto montada num jumentinho. A preparação da procissão decorre nos dois meses anteriores à sua realização, implicando a revisão dos adereços e indumentária, distribuição dos responsáveis pelos diversos quadros que compõem o cortejo e recolha de disponibilidades para figurantes. O programa da iniciativa é elaborado conjuntamente pela Junta de Freguesia e Paróquia, que também assumem uma parte significativa dos gastos necessários à sua concretização. Ao longo do percurso regista-se a atuação de alguns grupos corais colocados em pontos fixos entoando cânticos durante a passagem da procissão. Paralelamente à procissão realiza-se um programa cultural paralelo que integra exposições, concertos, ações de divulgação e promoção de exemplares de artesanato e doçaria inspirados na temática da Burrinha. Entre o Património Móvel envolvido destacam-se a imagem de Nossa Senhora do Egipto, a representação da Arca da Aliança e das Pirâmides do Egipto, luminárias, painéis e indumentária vária. PROCISSÃO DO SENHOR ECCE HOMO: Instituição responsável: Irmandade da Misericórdia Ano de início: século XVI Calendarização: Quinta-Feira Santa, 22h00 Ponto de partida: Igreja da Misericórdia Ponto de chegada: Igreja da Misericórdia Percurso: largo D. João Peculiar; rua do Souto; largo de Barão de S. Martinho; rua de S. Marcos; largo Carlos Amarante; rua do Anjo; largo de Santiago; rua do Alcaide; largo Paulo Orósio; rua de S. Paulo; largo de S. Paulo; rua D. Gonçalo Pereira; rua D. Paio Mendes; avenida S. Miguel-o-Anjo; Campo das Hortas; rua D. Diogo de Sousa. Freguesias: Cividade; S. João do Souto; Sé Distância: 1.790 metros Duração: 100 minutos Número de participantes: 640 Memória Descritiva: A procissão continua hoje a ser responsabilidade da Irmandade da Misericórdia, partindo e terminando na Igreja da Misericórdia. A temática desta procissão está especialmente ligada à instituição responsável, sendo que muitos dos painéis que se observam neste peculiar préstito mostram as obras de misericórdia, a visitação de Nossa Senhora a Santa Isabel, e Nossa Senhora da Misericórdia. Os estandartes processionais, que têm origem no século XVIII, destacam-se entre o figurado e apresentam uma iconografia relacionada com as devoções instituídas na igreja da Misericórdia, entre as quais a representação de Nossa Senhora da Misericórdia, as Abraçadas e o Senhor “Ecce Homo”. Além destes painéis artisticamente pintados, podemos admirar na procissão a imagem setecentista do Senhor “Ecce Homo” ou da Cana Verde, que nos mostra o Cristo sofredor, sentado sobre uma pedra, com o manto de purpura cobrindo a mesma, que nos incute um dramatismo bem presente no rosto da imagem e no seu dorso desnudo e impregnado de chagas provocadas pelo vigor do chicote. Nas mãos deste Cristo está, serenamente colocada, a Cana Verde simbolizando o ceptro real típico dos poderosos. O povo piedoso ajoelha-se à passagem do pesadíssimo andor que carrega a devotada imagem, sobre os ombros dos oito irmãos da Misericórdia que, estoicamente, a transportam. A abrir o cortejo, para além dos habituais cavaleiros da guarda, vêm as figuras vestidas de negro, os farricocos, que transportam lanternas de fogo (fogaréus) e as tradicionais matracas ou ruge-ruge que provocam nas ruas um ruído ensurdecedor, muito apreciado pela gente que assiste. No restante do cortejo representam-se cenas da paixão de Cristo. A acompanhar a procissão, para além da presença melodiosa de duas filarmónicas, desfilam as digníssimas autoridades religiosas e os irmãos da Misericórdia bracarense. Recentemente a procissão foi alvo de um importante processo de valorização com a integração de telas com a representação de cada uma das 14 obras de misericórdia, alusões a personagens relevantes na história da Misericórdia de Braga e a integração de representantes de Misericórdias de outras localidades, além da participação dos órgãos sociais da União das Misericórdias Portuguesas. A preparação da Procissão implica a publicação de uma convocatória dirigida aos Irmãos, a preparação dos adereços e indumentária, bem como a procura de figurantes para integrar os diferentes quadros. O Património Móvel associado integra principalmente a imagem e andor do Senhor Ecce Homo, estandartes seiscentistas, painéis das obras de misericórdia, balandraus matracas e fogaréus, lanternas e pálio, opas e círios. PROCISSÃO DO ENTERRO DO SENHOR: Instituição responsável: Cabido da Sé; Irmandade de Santa Cruz; Irmandade da Misericórdia Ano de início: século XVII Calendarização: Sexta-Feira Santa, 22h00 Ponto de partida: Sé Primaz Ponto de chegada: Sé Primaz Percurso: rua D. Paio Mendes; avenida S. Miguel-o-Anjo; Campo das Hortas; rua D. Diogo de Sousa; largo D. João Peculiar; rua do Souto; largo de Barão de S. Martinho; rua de S. Marcos; largo Carlos Amarante; rua do Anjo; largo de Santiago; rua do Alcaide; largo Paulo Orósio; rua de S. Paulo; largo de S. Paulo; rua D. Gonçalo Pereira. Freguesias: Cividade; S. João do Souto; Sé Distância: 1.790 metros Duração: 120 minutos Número de participantes: 1.000 Memória Descritiva: A Procissão do Enterro do Senhor realiza-se anualmente na noite de Sexta-Feira Santa, pelas 22h00, tendo como ponto de partida e de chegada a Sé Primaz. Ao longo de um percurso de 1,8 quilómetros, cerca de um milhar de participantes compõem o corpo do cortejo, entre figurantes, corporações religiosas e clérigos. É a mais solene e lúgubre, organizada como se umas exéquias reais se tratassem. Em sinal de luto, os Capitulares e os membros das Confrarias vão de cabeça coberta. Para mostrar a sua dor, as figuras alegóricas ostentam um véu de luto. Os andores carregados não produzem o habitual compasso provocado pelo impacto das varas dos pegadores no solo. O ruído estridente dos estandartes a arrastar pelo chão impregna todo o cenário. Instala-se o silêncio nas ruas da cidade, escurecidas pelo simbólico apagar das iluminações do comércio e das habitações. Junto às igrejas e aos altares de Passos ardem os tradicionais incensários. O piquete de cavalaria abre a procissão seguido pelos mesmos grupos de farricocos da noite anterior, desta feita com as matracas silenciadas e com os fogaréus arrastados pelo pavimento. Após o compasso de uma filarmónica desfilam algumas instituições juvenis cristãs, seguidas pelas bandeiras e estandartes da Irmandade de Santa Cruz e da Confraria dos Passos de Real, arrastando-se igualmente pelo chão. Intervalados por figurantes evocando os personagens e símbolos da Paixão de Cristo, seguem os andores da Cruz da Paixão e de Nossa Senhora da Soledade, transportados pela Irmandade de Santa Cruz. Intermediando ambos é transportado, aos ombros dos seminaristas, o esquife com a imagem do Senhor Morto. Abrigada sob um pálio, é acompanhada por um coro que entoa o mesmo cântico entoado durante a tarde nas naves da Catedral: «Heu! Heu! Domine! Heu! Heu! Salvator noster!» (Ai! Ai! Meu Senhor! Ai! Ai! Salvador nosso!). Seguem-se os Irmãos da Misericórdia com as suas lanternas, arrastando todos os seus painéis e estandartes. Ainda antes dos clérigos seguem os cavaleiros das Ordens Soberana de Malta e do Santo Sepulcro de Jerusalém. Antecipando o pálio seguem os Capitulares da Sé, um a um, arrastando um imenso véu negro pelo chão. Segue-se o Arcebispo Primaz carregando um ostensório sob o pálio, atrás do qual segue a bandeira oficial da Cidade juntamente com os dignatários municipais e representantes de outras entidades. Por fim segue a Comissão das Solenidades da Semana Santa, a banda filarmónica e as corporações de bombeiros. A preparação da Procissão implica a coordenação entre as parcelas da procissão assumidas por cada instituição, a preparação dos adereços e indumentária, bem como a trasladação dos andores pela Irmandade de Santa Cruz uma hora antes do início. O Património Móvel associado integra principalmente a imagem de Nossa Senhora da Soledade, o esquife do Senhor Morto, estandartes e painéis, lanternas e pálio, opas, turíbulos, ostensório e círios, bem como toda a indumentária envergada por clérigos e figurantes. RITO BRACARENSE: Detendo Braga uma particular tradição ritual, cuja vitalidade variou ao longo das eras, a Semana Santa afirma-se como momento primordial de afirmação desta emblemática manifestação ritual. A vivência de um rito litúrgico com peculiaridades diferenciadoras dos demais nos domínios eclesiais bracarenses é hoje uma realidade inegável, mesmo que não exista uma uniformidade nas abordagens históricas empreendidas. As versões sucessivamente revistas e atualizadas e que recuam, pelo menos, ao século VI, adequavam-se ao maior grau de empenho dos sucessivos pastores da Igreja bracarense. A bipolaridade dos ritos foi-se verificando ao longo da história, ora predominando o rito romano, ora prevalecendo o ritual citado como bracarense. O Breviário Bracarense foi alvo de sucessivas revisões e atualizações, tendo a última sido efetuada durante a prelazia de D. Manuel Vieira de Matos em 1924. Podemos dizer que os dois momentos mais marcantes da história da Igreja Católica no último milénio acabaram por garantir a sobrevivência deste rito que, mais do que portador de manifestações gizadas exclusivamente nesta comunidade eclesial, são um repositório de cerimoniais deixados por outros conjuntos litúrgicos e por prelados provenientes de outras pátrias ou tradições religiosas. O Concílio de Trento tornou obrigatório o rito romano, mas salvaguardou as dioceses e ordens religiosas com tradições próprias de mais de dois séculos, como era o caso do rito bracarense. O Concílio Vaticano II, após a aprovação da constituição “Sacrosanctum Concilium” que propôs uma revolucionária renovação litúrgica, prevê a conservação e incremento dos ritos legitimamente reconhecidos. Apesar disso, os sacerdotes da Arquidiocese, detendo liberdade para optarem pelo rito que sentissem mais conveniente, acabaram por maioritariamente escolher o renovado rito romano, condenando o secular rito bracarense a um apagamento quase completo. Recorde-se que o rito bracarense permanece inteiramente válido, apesar de não ter sido incluído pela reforma litúrgica subsequente ao Vaticano II. No entanto, o seu uso tornou-se facultativo a partir de 1971. Atualmente, o rito litúrgico bracarense subsiste apenas na Sé Primaz durante a Festa da Apresentação do Senhor, no Domingo de Ramos e Tríduo Pascal, ou então através da iniciativa de alguns sacerdotes. Estudado e academicamente averiguado, o rito bracarense consegue despertar curiosidade em alguns lugares do mundo, nomeadamente através do New Liturgical Movement, como é um caso singular de uma paróquia do estado de Rhode Island nos Estados Unidos, que repete o cerimonial da Dominga de Ramos tal como é proposto pelo Missal Bracarense. Além das solenidades e festas propostas pelo Rito Bracarense, nomeadamente as que se referem aos santos da Arquidiocese, entre os quais sobressaem S. Martinho de Dume, S. Frutuoso, S. Geraldo ou S. Pedro de Rates, mas também santos como S. Rosendo, Santo Ovídio ou Santa Senhorinha, esta proposta litúrgica diferencia-se das demais pelo seu carácter mariano verificado particularmente no antifonário proposto e também no peculiar destaque concedido a algumas celebrações da Igreja. Um dos tempos litúrgicos que sobressai com maior originalidade na Igreja bracarense é certamente a Semana Santa, durante a qual se verificam inúmeros momentos celebrativos associados a este secular rito litúrgico. Neste âmbito registam-se inúmeras manifestações cujo conteúdo seria interessante explanar, contudo centrar-nos-emos nas mais relevantes: a Dominga de Ramos e a Procissão Teofórica do Enterro. Convém, no entanto elencar as demais exteriorizações deste rito inseridas neste particular tempo litúrgico: - Na Quinta-Feira Santa, além das preces evocadas, destaca-se a bênção pontifical dada pelo Arcebispo entre a recitação do Pai Nosso e a comunhão, além da dimensão solene concedida à procissão que precede o despejo da reserva eucarística. - Na Sexta-Feira Santa o maior destaque é a Procissão Teofórica do Enterro, que abordaremos a seguir, contudo a celebração da Morte do Senhor detém ainda algumas particularidades nos cânticos propostos e na Adoração da Cruz. - A Vigília Pascal é outro momento de originalidade ritual, nomeadamente com a forma da Procissão da Ressurreição e das Vésperas Pascais com ida ao Baptistério. - No que concerne à Liturgia das Horas convém ainda assinalar as preces que são propostas para a oração de Laudes nos três dias do Tríduo Pascal. Já fora do âmbito da Semana Santa, mas ainda enquadrada no tempo pascal, surge uma festa devota a Nossa Senhora da Alegria ou dos Prazeres, assinalada na segunda-feira a seguir à Páscoa – a Pascoela – dia com enorme tradição celebrativa no entorno geográfico de Braga. Esta festa sublinha o caráter mariano atribuído ao rito e recorda uma celebração que no século XVI também era assinalada pelas Igrejas de Lisboa e de Évora.
  • Manifestações associadas:
    SOLENIDADE DE NOSSA SENHORA DAS DORES: A solenidade de Nossa Senhora das Dores da Basílica dos Congregados decorre na sexta-feira anterior ao Domingo de Ramos e no Sábado Santo, durante a Vigília Pascal, sendo constituída exclusivamente por manifestações de índole religiosa e devocional. O altar de Nossa Senhora das Dores é o mais destacado dos oito retábulos laterais da antiga igreja dos oratorianos de S. Filipe de Neri. Apesar do seu dia litúrgico ter sido fixado no calendário da Igreja Católica a 15 de Setembro, por intermédio do Papa Pio X, o seu culto foi estabelecido inicialmente no período quaresmal e assim se manteve neste templo da cidade de Braga. A Festa de Nossa Senhora das Dores, outrora inserida no programa oficial das Solenidades da Semana Santa de Braga, coincide propositadamente com a passagem do Lausperene Quaresmal pelo templo dos Congregados. Na sexta-feira o Lausperene é encerrado com uma missa solene, acompanhada de eloquente sermão e grande instrumental, dedicada a Nossa Senhora das Dores cuja imagem surge devidamente enquadrada entre velas e flores. Para esta ocasião, veste-se a indumentária solene à imagem de roca, que assim se mantém duas semanas. O segundo ato desta solenidade decorre na noite do Sábado Santo, mais propriamente durante a celebração da Vigília Pascal na Basílica dos Congregados. A imagem de Nossa Senhora das Dores é retirada do seu retábulo e colocada na capela-mor em cima de um pedestal. Durante a celebração o presidente da celebração, evocando a alegria de Maria perante a ressurreição, recorda os sete momentos da sua vida que lhe rasgaram a alma. Enquanto enumera cada um dos sete, vai retirando, uma a uma, as espadas suspensas na imagem de Nossa Senhora. A cerimónia finda com a coroação da imagem, retirando-se o resplendor e colocando-se uma coroa real. Este cerimonial, hoje exclusivo deste templo, aqui teve a sua origem e daqui se propagou para outros lugares. Recorde-se que o culto a Nossa Senhora das Dores detém na cidade de Braga uma importante tradição, já que foi partindo do convento dos padres oratorianos que esta devoção se propagou para muitas terras do Norte de Portugal – Póvoa de Varzim, Trofa, Ponte de Lima - e também para Minas Gerais (Brasil). A imagem de Nossa Senhora das Dores foi solenemente benzida pelo Arcebispo D. Gaspar de Bragança a 14 de Janeiro de 1761, tendo posteriormente sido implantado um culto que rapidamente se enraizou entre os fiéis bracarenses. Além do templo dos Congregados, esta devoção estender-se-ia, em moldes similares, aos templos do Pópulo e do Carmo. PÁSCOA NA CÓNEGA: A Páscoa na cidade de Braga não se limita ao Domingo festivo. O "after-day" tem direito a significativos regozijos, que podem entreter o mais prolongado turista. A mais significativa festividade realizada dentro da área urbana, mais propriamente na paróquia da Sé, bem no centro histórico de Braga, acontece na tradicional e bairrista rua da Cónega. As celebrações pascais da rua da Boavista (Cónega), cuja designação formal é Festa do Senhor das Ânsias, decorrem entre a noite de Sábado Santo, após a vigília pascal, estendendo-se até à segunda-feira de Pascoela. A mordomia é assumida rotativamente por uma das famílias da Cónega. O programa de celebrações inicia-se oficialmente com a tradicional Queima do Judas na noite da vigília pascal. Na praça lateral à igreja do Pópulo é aparelhada uma figura forrada com palha e material pirotécnico, personificando Judas Iscariotes, o discípulo que entregou Jesus Cristo. À meia-noite em ponto dá-se o estouro do traidor, acompanhado de uma pequena sessão de fogo preso. No Domingo de Páscoa decorre grande sarau noturno na praça lateral à Igreja do Pópulo, onde se costuma assistir a um espetáculo musical e pirotécnico, antecipado muitas vezes pela subida a um elevado pau ensebado com um bacalhau no topo. O dia grande das celebrações acontece na segunda-feira, iniciando-se o programa com uma missa solene na capela do Senhor das Ânsias localizada a meio trânsito na rua da Boavista. No final da celebração é efetuada a visita pascal à urbanização da Quinta das Hortas e a outras zonas limítrofes da rua da Boavista. Para a tarde está reservada a visita pascal ao cerne da festa. A visita pascal tem início no interior da Catedral pelas 15h00, onde o pároco da Sé preside ao momento de oração que costuma antecipar a saída do compasso. Em seguida, acompanhados por uma banda filarmónica saem os quatro Compassos em cortejo festivo até à rua da Boavista, onde uma multidão os aguarda. Chegados à tradicional artéria, decorada com as costumadas ornamentações minhotas e trajada de colchas nas janelas, realiza-se a visita pascal a todas as habitações da rua, momento participado por moradores, familiares e antigos habitantes da Cónega. No céu estouram morteiros e a toada da filarmónica que acompanha abafa os ruídos jubilosos da multidão. Apesar de ser segunda-feira, a festa da Ressurreição de Cristo continua como se feriado se tratasse. As celebrações pascais da rua da Cónega deverão recuar ao ano de 1695, altura em que foi iniciada a devoção ao Senhor das Ânsias neste local.
  • Contexto transmissão:
    Estado de transmissão activo
    Descrição: A transmissão das manifestações realizadas no âmbito da Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga é efetuada particularmente através das instituições promotoras das mesmas, nomeadamente o Cabido da Sé, Irmandade de Santa Cruz, Santa Casa da Misericórdia, entre outras entidades religiosas que registam participação neste contexto. Contudo, regista-se um papel propulsor destas manifestações da parte das instituições de carácter civil como é o caso da Câmara Municipal de Braga e da Entidade Regional de Turismo Porto e Norte, que apoiam financeira e logisticamente a Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga, garantindo assim a sua subsistência no quotidiano da comunidade bracarense e, por conseguinte, a sua transmissão. A participação e envolvimento da população é garantido através da tradição religiosa bastante enraizada nos costumes e hábitos familiares e comunitários. Partindo das entidades organizadoras e cooperantes, as manifestações são devidamente acompanhadas e participadas pela população natural dos territórios onde decorrem as manifestações e também por indivíduos das restantes freguesias do Município de Braga.
    Data: 2016/09/09
    Modo de transmissão oral e escrita
    Idioma(s): Português
    Agente(s) de transmissão: Cabido da Sé de Braga, Santa Casa da Misericórdia de Braga, Irmandade de Santa Cruz, Câmara Municipal de Braga, Entidade de Turismo do Porto e Norte de Portugal, Associação Comercial de Braga.
  • Origem / Historial:
    No âmbito de uma contextualização teórica da Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga, o primeiro passo será explorar a história do Cristianismo e os fundamentos que presidiram à ritualização da denominada Semana Santa e, particularmente, do Tríduo Pascal. Não podemos esquecer que é a memória em torno do acontecimento da morte e ressurreição de Jesus Cristo que funda a própria fé cristã e fundamenta toda a sua teorização. O imaginário da Paixão de Cristo, aplicado ao cenário histórico bracarense, foi capaz de se expressar de formas tão sublimes e perenes como os casos do Bom Jesus do Monte ou da igreja de Santa Cruz, no âmbito material, ou os cerimoniais que compõem a Semana Santa de Braga, quando nos referimos às manifestações imateriais. Todos estes exemplos contêm uma origem individualizada, apartada no tempo e nas vontades, contudo são expressão de um ímpeto presente no ideário coletivo que versa sobre a mais dramática e emotiva narração da mundividência judaico-cristã. A Paixão de Cristo, entendida como o conjunto de relatos que a tradição cristã sublinha a respeito do momento crucial da existência terrena de Jesus Cristo, é uma temática indissociável da experiência comunitária do Cristianismo. Trata-se do clímax de toda a narrativa evangélica e momento que antecipa o acontecimento fundador da fé cristã. Por isso mesmo, todos os gestos, palavras e contextos que marcaram as últimas horas da vida de Cristo foram sendo exaltados na vivência espiritual dos cristãos e na própria estrutura doutrinal. Os relatos dispostos nos quatro Evangelhos são as mais imediatas referências na construção de um imaginário da Paixão de Cristo, contudo a tradição cristã, impelida particularmente a partir da conquista dos lugares sagrados pelos cristãos, acabou por fazer emergir novos referenciais narrativos ao percurso de Cristo desde o Pretório até ao Calvário, sobretudo procedentes do exercício da Via Crucis a partir do século XII. Torna-se, pois, imperativo perceber que movimentos espirituais e sociais impulsionaram um enraizamento significativo do excelso momento do imaginário cristão na fisionomia e na sociabilidade da comunidade bracarense. O elaborado e complexo conjunto de rituais, que se foram enraizando na tradição cristã, é portador de um universo simbólico e representacional muito vasto. A homogeneidade ritual imposta, particularmente a partir dos séculos VI e VII, no seio da Igreja Católica provocou uma simbiose particular entre as formas de vivência comunitária das principais celebrações do calendário cristão. Este facto acabou por ser inibidor do surgimento de ritos próprios, o que resultou numa frequente repetição de abordagens cerimoniais impostas pelo ordinário cristão. Por isso mesmo, para se falar da origem da Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga temos necessariamente que perceber que estas celebrações se realizam um pouco por todo o mundo cristão e que, mesmo as procissões, entendidas como fenómeno de envolvimento social que obedecem a uma temática específica e a uma ordem reguladora, se repetem um pouco por todo o país. Recuando ao período que intermedeia o último quartel do século XVII e os finais do século XVIII, assistiremos a uma Braga a fervilhar de devoção, com a fundação de inúmeras confrarias e com a construção de novos templos e a reforma de outros. Nessa altura, o calendário anual de procissões ultrapassava as largas dezenas. A Semana Santa era um momento significativo para algumas delas. Não havia propriamente um programa geral de celebrações, sendo que muitas delas coincidiam no espaço e no tempo. A partir do momento em que a Irmandade de Santa Cruz, fundada em 1581, e em que a Irmandade da Misericórdia, fundada em 1513, se começaram a afirmar no quotidiano bracarense, as suas procissões adquiriram um igual destaque entre as demais. Recordemos que as pessoas mais influentes da cidade pertenciam a estas Irmandades e isso poderá explicar a dimensão que as suas grandes celebrações anuais adquiriram. A Procissão dos Passos deverá ter alcançado particular protagonismo quando a Confraria do Bom Jesus dos Passos, erigida na igreja do Pópulo, se uniu à Irmandade de Santa Cruz, no ano de 1773, embora já se realizasse desde o ano de 1597. A Procissão do Senhor “Ecce Homo”, com origens provavelmente no século XVI, ganhou relevo pelo facto de ser um préstito de penitentes, os denominados “farricocos”, que hoje são símbolo da Semana Santa, mas que outrora pungiam os seus pecados neste percurso. Por outro lado, temos o Cabido da Sé Primaz, responsável pelas celebrações do Tríduo Pascal, nas quais participa o Arcebispo Primaz. Por isso, estas celebrações tornaram-se nas mais solenes e sumptuosas da cidade, para além de ostentarem o secular rito bracarense, do qual se destaca a Procissão Teofórica do Enterro, que percorre as naves da Catedral. A Sé é ainda o ponto de partida da Procissão do Enterro do Senhor, na qual participam diversas confrarias de Braga, para além das já citadas Irmandades. Acrescentando a estes destacados momentos, hemos também como objeto de abordagem a tradição do Lausperene Quaresmal, iniciado em 1710 pelo Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles e que continua a realizar-se com significativa vitalidade. A centralidade do espaço físico da Sé Primaz é inequívoca nestas celebrações. Portadora das principais dinâmicas sociais e religiosas de Braga ao longo de vários séculos, a Catedral é igualmente sede espácio-temporal dos acontecimentos que envolvem e determinam a Semana Santa enquanto realidade unívoca. Este facto obriga-nos a um estudo aprofundado do conteúdo representacional presente no monumento mais paradigmático da história de Braga. As procissões são os elementos mais característicos do programa da Semana Santa. A procissão foi-se tornando, particularmente no decorrer do século XVI, um elemento indispensável em qualquer celebração de índole religiosa. A sua origem enquanto dramatização pública recua ao século XVIII, momento histórico em que alcançou um estatuto de relevo nas dinâmicas sociais em Portugal. Centrada em torno de uma imagem/escultura relativa à celebração, este tipo de manifestação religiosa foi buscando novas formas de substituição dos primorosos teatros sacros elaborados durante o período barroco. A presença de figurantes vestidos de “anjinhos”, representando personagens bíblicas, passagens da vida de Cristo, e uma plêiade de santos e santas, tornou-se a imagem de marca das procissões. Para além do desfile das confrarias organizadoras do préstito, surge como elemento demarcador da sacralidade deste tipo de cortejos, o pálio sob o qual se abriga o clérigo que preside, exibindo um relicário a cuja passagem todo o povo se ajoelha. Nas janelas, o povo que assiste atira pétalas de flores e expõe majestosas colchas púrpuras, que conferem um colorido particular às ruas atravessadas pela procissão. A Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga funda, pois, a sua imagem hodierna num conjunto de tradições constantes particularmente nos últimos três séculos. As suas representações mais relevantes são efetivamente as procissões, autênticas recriações do cerimonial público cristão, com uma capacidade mobilizadora assinalável e cuja essência ultrapassa claramente os limites da crença devocional e se situa hoje num patamar turístico-cultural evidente. Integra ainda algumas dimensões relacionadas com o cerimonial específico da Sé de Braga e com algumas práticas devocionais cuja vitalidade se mantém. As manifestações enquadradas com a Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga revelam-se hodiernamente como fenómeno turístico, envolvendo a comunidade num ambiente e vivência muito particular, apelando às raízes cristãs que acompanharam a história da própria cidade. Surge hoje com um programa unificado e com uma comissão organizadora que tenta mobilizar as entidades civis e religiosas em torno de objetivos comuns, porém, no passado, estava integrada nas dinâmicas próprias do tecido organizacional das instituições religiosas da cidade. Esta coordenação entre instituições, já antevista de forma informal na imprensa da segunda metade do século XIX e primeiro quartel da centúria seguinte, haveria de instituir-se de forma oficial na década de 1940, segundo cremos por influência do então Secretariado Nacional de Informação e também pelo preponderante papel que então detinha a Associação Comercial de Braga, vulgo Grémio do Comércio, que pretendia criar um segundo polo de atração para além do São João. A criação da Comissão da Quaresma e Solenidades da Semana Santa já na década de 1980 veio fomentar um trabalho coordenado. Foi, contudo, no século XXI, mais propriamente a partir de 2003 que uma nova dinâmica de comunicação e valorização começou a ser estruturada, nascendo nessa fase o desejo de ir mais longe na salvaguarda e valorização de um conjunto de práticas fundamentais para a identidade bracarense. LAUSPERENE QUARESMAL: Na cidade de Braga há uma particular tradição que continua a subsistir entre os fiéis: a adoração eucarística do Lausperene Quaresmal. Instituído em toda a cidade de Braga desde 1710, é um dos rituais que se mantém enraizado na vivência deste “tempo favorável” que a Igreja propõe aos cristãos. O Lausperene Quaresmal constitui-se como uma das tradições mais importantes da preparação pascal na cidade de Braga. A iniciativa partiu do arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles, de cuja energia e dinamismo Braga favoreceu entre 1704 e 1728. Este prelado, quando em 1710 fez o relatório para a sua primeira visita “Ad Limina”, pediu ao Papa Clemente XI a instituição do Lausperene Quaresmal nas igrejas da cidade de Braga, começando na Quarta-feira de Cinzas e terminando no Domingo de Ramos. Esta celebração deveria ter as mesmas indulgências que haviam sido concedidas anteriormente às igrejas de Lisboa, no ano de 1682. Passados mais de três séculos, esta tradição continua viva e enraizada na vivência quaresmal dos bracarenses. São, no total, 23 os templos que acolhem o lausperene quaresmal, que decorre ao longo de dois dias em cada igreja, tempo durante o qual a Sagrada Eucaristia está exposta em adoração permanente desde o princípio da manhã até ao fim da tarde. O calendário não tem sofrido significativas alterações nas últimas décadas. Esta tradição apenas se realiza nos templos de maior dimensão, sendo que dois deles sucumbiram nas primeiras décadas do século XX: a igreja dos Remédios, demolida em 1911 (7); e a igreja do Paço (atual Arquivo Distrital), desmantelada em 1921. Com a criação da paróquia de Santo Adrião em 1983 e como alargamento da área da cidade até Ferreiros, estas duas paróquias passaram recentemente a estar também integradas no calendário do Lausperene Quaresmal. Entretanto, todos os templos da cidade deveriam ser dotados de um trono eucarístico na capela-mor, para que se pudesse fazer a exposição do Santíssimo Sacramento, com a devida magnificência, entre outras alfaias necessárias para o mesmo cerimonial. Esta tendência da arquitetura religiosa vigorou entre os séculos XVII e XIX, particularmente após as recomendações eclesiais para uma adoração eucarística mais frequente, como resposta ao jansenismo, o movimento criado pelo bispo holandês de Ypres, Cornellius Jansenius (Jansen), em meados do século XVII. As igrejas surgem transfiguradas. Trata-se do momento mais elevado do ano, altura única em que os fiéis bracarenses se deslocam em massa a estes lugares sagrados. Os templos, que acolhem durante dois dias a adoração eucarística, são decorados primorosamente com flores, velas e monumentais cortinas, contrastando com a austeridade que os cânones litúrgicos aconselham por estes tempos quaresmais. As tribunas, habitualmente localizadas ao centro do altar-mor em forma de escada, continuam a ser o lugar por excelência da adoração eucarística, sobre a qual se exibe, muitas vezes, a custódia ostentando as sagradas partículas do Corpo de Cristo. Apesar dos recentes preceitos do Concílio Vaticano II recomendarem que os tronos não estejam demasiado distantes dos fiéis, continua a cumprir-se a tradição bracarense de os pompear decorados, mesmo nos casos em que a custódia é colocada já sobre a mesa do altar. A porta principal da igreja é vedada com uma enorme cortina púrpura, de forma a assinalar o “Louvor Perene” (lausperene) que é vivenciado no seu interior. Junto à entrada, acolhem-se também as habituais “rebuçadeiras”, que expõem os tradicionais “rebuçados do Senhor” embrulhados em papéis multicolores, tentando os crentes com promessas mélicas que possam quebrar o seu jejum quaresmal. Em tempos não muito recuados, as igrejas competiam entre si pelo título de mais bela do lausperene quaresmal, daí o esmero nas decorações dos templos, que as zeladoras adstritas a cada lugar sagrado faziam questão de confirmar. Ainda se ouve dizer que o Senhor «esteve bem mais bonito na minha igreja», em subsistências de conversas entre vizinhas. Uma rivalidade ”sagrada” que o tempo acabou por desgastar. Hoje a maioria dos fiéis que frequentam as igrejas durante o sagrado lausperene buscam a oração e o recolhimento, o sentimento de que a proximidade com o Corpo de Cristo se torna realidade mais efetiva neste tempo favorável que é a Quaresma. A prática da adoração eucarística tem raízes na criação da reserva das espécies sagradas, que terá surgido ao longo da Idade Média como expressão da necessidade derivada da crescente participação de fiéis nas Eucaristias. Nos primeiros séculos da Igreja, a “reserva eucarística” destinava-se principalmente a guardar de maneira digna a Eucaristia, para ser levada aos doentes e aos moribundos. Dada a necessidade de serem consagradas um número considerável de partículas, foram surgindo os primeiros sacrários, para que os elementos sagrados estivessem protegidos de profanação por ratos e homens ímpios. As espécies deveriam ser mantidas em local fechado à chave e, por vezes, inseridas num recipiente alto o suficiente para estar fora do alcance de quem tivesse intenções profanas. No início a reserva eucarística tinha lugar discreto nas sacristias. A partir do século XI começa a ocupar lugar no corpo da igreja, na proximidade do altar, num cofre móvel. Progressivamente, constroem-se tabernáculos monumentais. Por fim, já no século XVI, o sacrário ocupará lugar no próprio altar. Assim, o culto e o respeito pelos lugares onde se localizavam os sacrários, salientados como lugares da presença real de Jesus Cristo na Eucaristia, foram ganhando relevo na vida eclesial. Perto do final do século XI, entramos em uma nova era na história da adoração eucarística. Berengário (999-1088), arcediago de Angers, na França, negou publicamente que Cristo era real e fisicamente presente nas espécies do pão e do vinho. Este caso obrigou à intervenção do Papa Gregório VII que, para além de ordenar que Berengário se retractasse, fomentou a existência de uma espécie de renascença eucarística. Foram instituídas, por este tempo, procissões do Santíssimo Sacramento, atos de adoração ou visitas a Cristo na píxide. Já no princípio do século XII, foi incentivada a elevação da hóstia consagrada, rito desconhecido até então, mas que ganhou uma popularidade extraordinária. Nasce o costume, em alguns lugares, de tocar o sino, para que os ausentes acorressem à elevação. Paralelamente, é introduzida pouco depois a elevação do cálice, embora não se pudesse ver o preciosíssimo sangue. Introduz-se igualmente o costume da incensação às elevações depois da consagração, a partir do século XIV. Pela mesma época, surgem as genuflexões do celebrante depois das elevações. A contemplação da hóstia adquire tal importância que chega a ser considerada uma forma de comunhão - comunhão pelo olhar-, paralela ou mesmo equivalente, para alguns teólogos, à comunhão sacramental. Enquanto se discutia o valor da comunhão pelo olhar, ia diminuindo a participação na comunhão sacramental. Desde há muito que se assistia a uma progressiva redução da participação dos fiéis na comunhão, a ponto de surgirem intervenções do Magistério prescrevendo aos fiéis os mínimos aceitáveis para um cristão. Assim, no século XIII, o Concílio IV de Latrão (1215) sentiu a necessidade de determinar a comunhão ao menos uma vez por ano, na Páscoa. Não havia nada de surpreendente, portanto, quando o Papa Urbano IV, no século XIII, mais precisamente a 11 de agosto de 1264, instituiu a festa de Corpus Christi. Como prolongamento da sagrada exibição da hóstia na missa, nascem as procissões eucarísticas, ligadas a esta festa, e que se tornam na maior exibição pública da fé cristã. Em Portugal ainda hoje existem inúmeras tradições associadas à festa do Corpo de Deus. Em 1592 o Papa Clemente VIII assina um documento intitulado “Quarenta Horas”, instituindo uma devoção de quarenta horas de oração contínua antes do Santíssimo Sacramento ser exposto. Na Sé Primaz de Braga ainda hoje se realiza esta celebração, nos três dias anteriores ao início do Lausperene Quaresmal. PROCISSÃO DO SENHOR DOS PASSOS: A Procissão do Senhor dos Passos será, porventura, o mais repetido cerimonial associado à vivência quaresmal que se observa no território português e que perpassou para os seus antigos domínios coloniais. Esta tradição, inserida nas dinâmicas devocionais posteriores ao normativo tridentino, enraizou-se graças à sua vinculação à oração da Via Crucis, cuja popularização se verificara durante a Baixa Idade Média. O epicentro deste cerimonial está intimamente vinculado à presença da Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho em Portugal. Foi no convento de Nossa Senhora da Graça de Lisboa, casa-mãe da ordem no nosso país, que se registou a mais antiga ocorrência de um cerimonial público enquadrado com o imaginário ordinariamente atribuído às procissões do Senhor dos Passos. A primeira procissão dos Passos, podemos afirmá-lo, decorreu no ano de 1587 por iniciativa da Irmandade de Vera Cruz e Passos de Cristo, instituída no ano anterior por Luís Álvares de Andrade, paroquiano de São Nicolau e pintor régio. Segundo consta, ter-se-á inspirado nos grandes cerimoniais que, por este tempo, se realizavam em Castela, particularmente na cidade de Sevilha com as iniciativas do Marquês de Tarifa. Exatamente uma década após a instituição da procissão dos Passos no convento agostiniano da Graça em Lisboa, ou seja em 1597, a cidade de Braga vai assistir à instituição da Irmandade do Bom Jesus dos Passos (ou dos Passos do Senhor) no recém-criado convento do Pópulo. A iniciativa, não duvidamos, terá partido do próprio D. Frei Agostinho de Jesus, dado que a corporação religiosa vem a surgir apenas um ano depois do lançamento da primeira pedra do templo conventual. É inevitável efetuar uma vinculação entre o surgimento da confraria bracarense no seio de um convento agostiniano e a congénere lisboeta. A procissão dos Passos, tão enraizada no cultual cristão, iniciou-se no convento agostiniano de Nossa Senhora da Graça, na cidade de Lisboa, recuando a primeira ocorrência ao ano de 1587. Está confirmado, pois, o papel disseminador dos agostinianos na difusão da devoção aos Santos Passos no nosso país. Recordemos que o Arcebispo D. Frei Agostinho de Jesus, responsável pela instituição da Procissão dos Passos em Braga, era Vigário Geral da ordem em Portugal na altura em que a procissão terá surgido e que tinha residência fixa na comunidade religiosa instalada no convento da Graça. Portanto, é muito provável que tenha assistido à primeira e segunda ocorrência do préstito. Aliando a este dado a forte devoção do prelado à Paixão de Cristo, naturalmente que o desejo de reproduzir similar cerimonial na cidade arquiepiscopal se manifestaria, ainda mais quando falamos de uma personalidade de tão magno dinamismo e iniciativa. Isto poderá explicar o porquê do surgimento de uma corporação religiosa no ano imediato à fundação do convento agostiniano de Braga, particularmente quando as obras de construção da igreja ainda não estavam concluídas. A Irmandade do Bom Jesus dos Passos foi instituída em 1597, provavelmente com o intuito de realizar anualmente a procissão que o Arcebispo vira iniciar-se em Lisboa. Desconhecemos o ano em que o préstito se terá realizado a primeira vez, mas é plausível que tenha sido em 1597 ou 1598. A cidade de Braga poderá ter sido, depois da capital, uma das primeiras urbes portuguesas a realizar a procissão dos Passos. Este facto reveste-se de grande significado quando sabemos que a igreja do Pópulo foi o epicentro deste cerimonial na cidade de Braga. Segundo apuramos através do Livro de Estatutos da Irmandade dos Passos de 1707, a procissão já integrava a trasladação da imagem do Bom Jesus dos Passos no sábado anterior e tinha como templo coadjuvante a Igreja do Colégio de São Paulo, tal como ainda hoje perdura. A este facto não será alheio a circunstância da Procissão dos Passos da Graça em Lisboa ter servido de modelo ao préstito bracarense. Também em Lisboa a trasladação decorre entre o templo dos agostinianos e o antigo templo da Companhia de Jesus. Segundo a mesma fonte, no início do século XVIII já seriam armados os altares dos Santos Passos ao longo do percurso, apesar de serem ainda por esta altura apenas estruturas efémeras. Outro dado relevante é o percurso que a procissão tomava, segundo cremos, desde a sua introdução na cidade de Braga, muito similar ao atualmente adotado, com a alteração do seu epicentro desde a Igreja do Pópulo para a Igreja de Santa Cruz, consumada em 1773. Trasladação: Igreja do Pópulo, Campo da Vinha, Postigo de Santo António, Campo de Touros, rua dos Gatos, praça do Pão, rua Dom Gualdim, largo do Colégio, Igreja de São Paulo. Procissão: Igreja de São Paulo, largo de São Paulo, Postigo de S. Sebastião, rua do Alcaide, Campo de Santiago, rua do Anjo, Campo dos Remédios, Porta de São João, rua de São João, Oussias, Travessas, rua do Campo, Porta da Ajuda, Campo das Hortas, Porta Nova, Rua Nova, Rua do Souto, Porta do Souto, Campo de Santana, Campo da Vinha, Igreja do Pópulo. Organizada presentemente no Domingo de Ramos pela Irmandade de Santa Cruz, sediada no templo homónimo, a procissão dos Passos poderá ser o mais ancestral cerimonial integrado nas Solenidades da Semana Santa bracarense. A Irmandade de Santa Cruz apenas realiza esta procissão desde o ano de 1773, altura em que a confraria então existente se fundiu com a Irmandade dos Passos, que chegou a estar sediada na demolida capela de Santana (entre 1735 e 1769), e que já teria a incumbência de realizar esta procissão. Esta corporação instalou-se inicialmente na igreja do Pópulo, numa das capelas laterais. Isso mesmo está referido no Dicionário Geográfico do Padre Luís Cardoso: “Capella do Senhor com a Cruz às costas, que he, e tem a Irmandade dos Passos do Senhor, que na terceira Dominga da Quaresma costuma fazer nesta Cidade a Procissão dos Passos” A referida capela é a primeira capela lateral do lado do Evangelho, se contarmos a partir da capela-mor e encontra-se revestida com painéis azulejares alusivos à temática. Não restam dúvidas de que a instituição da Irmandade dos Passos do Senhor, ocorrida apenas um ano após a fundação do convento do Pópulo, está vinculada à realização desta tradição quaresmal na cidade de Braga. Outro dado significativo que recolhemos é o relato da participação de D. Frei Agostinho de Jesus na procissão, facto que revela o seu protagonismo na introdução deste cerimonial na cidade de Braga. Segundo consta, terá sido durante a realização da procissão na Quaresma de 1609 que o Arcebispo terá tido a sua última aparição pública antes de falecer. Isso mesmo confirma D. Rodrigo da Cunha e, certamente por sua influência, Frei Domingos Vieira: “(…) tão grande abalo sentiu d’hum Sermão de Pretorio, que sahindo, como costumava, a acompanhar a Procissão, soffreo hum acidente, de que o levarão para o paço quasi sem sentidos. Daqui, dizem, que se lhe originara a doença, de que morreo” A procissão a que se refere o biógrafo é a procissão dos Passos, dada a referência que é feita ao sermão do Pretório, que no relato da História Eclesiástica dos Arcebispos de Braga é designado por “sermão dos Passos”. O sermão do Pretório dava arranque à procissão, realizado no interior do templo de onde partia o préstito. Centrada na figura do Senhor que carrega a cruz às costas, a procissão encena todo o percurso que Cristo realizou, segundo a tradição cristã relatada nos evangelhos, entre o Pretório e o Calvário, que davam mote a dois sermões no arranque e encerramento do préstito respetivamente. Outro dado a ressaltar do relato é o envolvimento pessoal do Arcebispo na realização da procissão, facto aduzido na expressão “costumava (…) acompanhar a procissão”. Se costumava, naturalmente que a procissão se teria iniciado uns anos antes deste episódio, sucedido, segundo cremos, em 1609. Esta procissão, que hoje dá arranque à Semana Santa de Braga, ter-se-á continuado a realizar ininterruptamente até aos nossos dias, tendo a igreja do Pópulo como epicentro até ao ano de 1735, altura em que os frades agostinianos manifestaram divergências com a Irmandade ali sediada. Silva Thadim descreve a trasladação da Irmandade na sua Época dos Annaes e Memórias bracarenses (vol. I, p. 129): “Aos 10 de Julho sahio a Irmandade dos Santos Passos da Igreja do Pópulo com a sua Imagem em procissão, e a Senhora da Piedade, e foram para a Capella de Santa Ana defronte dos Congregados por duvidas que a Irmandade teve com os Religiosos”. Transferida para a capela de Santana, numa solene procissão, a corporação religiosa acabou mais tarde na igreja da Lapa, em virtude da demolição da capela e, passados três anos, fixou-se definitivamente na igreja de Santa Cruz. No passado, porém, a procissão conservava outras particularidades. A exemplo, na procissão que se realiza na véspera, a imagem do Senhor dos Passos era conduzida “...encerrada num pavilhão ou camarim portátil...” o que não permitia que a imagem fosse contemplada pelos fiéis que a acompanhavam no trajecto para a Igreja do Colégio, segundo nos conta um jornal de há 50 anos atrás. Isto ainda hoje se verifica na Procissão dos Passos da Graça em Lisboa. Outra particularidade ligada a esta procissão era a presença de uma banda de música que acompanhava instrumentalmente o grupo coral, segundo vem referido no Comércio do Minho do dia 29 de Março de 1873: “...a venerável imagem do Senhor dos Passos(...) é acompanhada pela banda regimental...”, ou então como nos diz o Diário do Minho de 10 de Abril de 1954: “...e se incorporou uma banda de música(...) quando passava ao largo de Santiago.”. Relativamente à procissão dos Passos, sabemos que o sermão do Encontro não se realizava, ocorrendo sim dois sermões: o Sermão do Pretório e o Sermão do Calvário, o primeiro realizado na Igreja do Colégio, ao iniciar-se a procissão, e o último ao recolher, junto da Igreja de Santa Cruz, o que vem citado num jornal de há 100 anos atrás. Outra curiosidade é a data pois esta procissão não se realizava no domingo de Ramos mas no 5.º Domingo da Quaresma, ou seja, uma semana antes no chamado Domingo da Paixão. No seu início, e pelo menos até meados do século XVIII, a procissão realizava-se na “terceira Dominga da Quaresma”. A procissão tinha também uma índole penitencial, tal como a congénere procissão de penitência que a Misericórdia realizava na Quinta-Feira de Endoenças. São várias as indicações encontradas nos sucessivos livros de estatutos a este respeito. Os penitentes poderiam acompanhar o andor do Bom Jesus dos Passos ou irem “vestidos de (farri)cocos”. Aborda-se ainda a presença de “disciplinantes” ao longo do préstito. A procissão abria precisamente com grandes filas de farricocos, estes de túnicas roxas, vestidos desta forma para se diferenciarem da tonalidade negra utilizada pela Misericórdia na procissão de Quinta-Feira Santa. Em memória deste facto, a procissão dos Passos integra no préstito um farricoco trajando de roxo, que abre a procissão com uma trombeta na mão, a mesma que no passado era tocada ao longo do percurso. Também no século XVIII já se verificava a presença de anjinhos que não poderiam ter “nove anos de idade para baixo “ e deveriam ser “bem vestidos para conduzir cada um deles à representação do martírio do Senhor”. No final a Irmandade entregava a cada um “meio arrátel de confeitos”. Uma das tradições associadas a esta procissão era a célebre “Enfiada”, realizada na passagem sob os arcos da Porta de São João, passagem da antiga muralha fernandina que foi demolida em 1867, localizada sensivelmente junto à casa dos Coimbras. Os gigantescos estandartes que ainda hoje acompanham a procissão, de forma a ultrapassarem a “baixa” estatura do arco, precisavam de quase tocar o solo, perante um esforço físico descomunal da parte de quem os carregava. Admirando esta cena, o povo aglomerava-se nestas passagens, onde aplaudia a heroicidade do porta-estandarte. Após a demolição da porta, em memória desta tradição, os estandartes eram rebaixados, simulando o antigo costume. PROCISSÃO DA BURRINHA: A Procissão da Senhora da Burrinha, presentemente designada como cortejo bíblico “Vós sereis o meu povo”, tem um historial bastante mais longo que o que lhe é habitualmente atribuído ordinariamente. A sua origem está intimamente relacionada com as práticas devocionais promovidas pela Irmandade de Nossa Senhora das Angústias sediada plausivelmente desde a segunda metade do século XVIII na Igreja de S. Victor. Esta corporação religiosa, que renovou os seus estatutos no ano de 1852, terá sido fundada antes de 1769, dado registar-se neste ano a “reforma da imagem de Nossa Senhora das Angústias” segundo informação constante no inventário da mesma Irmandade. Significa isto que a procissão anual em honra de Nossa Senhora das Angústias, que deveria ter lugar “na Primeira Dominga de Julho”, se poderá ter começado a realizar ainda no século XVIII. A devoção a Nossa Senhora das Angústias está intimamente vinculada ao imaginário da Paixão de Cristo, detendo um ideário cultual que se desenvolveu com particular consistência ao longo da Idade Média. São vastos os exemplos artísticos que exploram a imagem de Nossa Senhora aos pés da Cruz, entre lágrimas e suspiros, acolhendo o corpo do seu filho já sem vida. Angústias, Soledade, Piedade, Aflição ou Pranto são invocações marianas que integram o mesmo ideário devocional, que foi sendo fomentado particularmente através do poema popular “Stabat Mater Dolorosa”, concebido algures na Idade Média e no qual é comentado o sofrimento de Maria aos pés da cruz. A integração deste hino nas práticas devocionais da Igreja Católica não foi inicialmente consensual, tendo chegado mesmo a ser proibido em 1570. Era então muito discutida a coadunação da perfeição divina de Maria com a possibilidade de ter experimentado o sofrimento e ter chorado diante da morte do seu filho Jesus Cristo. A progressiva aceitação do sofrimento como expressão natural da condição humana de Nossa Senhora acabou por fomentar os cultos centrados no imaginário da “Stabat Mater Dolorosa”. A autoria desta composição tem sido atribuída diferenciadamente a São Gregório Magno (604), São Bernardo de Claraval (1153), Inocêncio III (1216), São Boaventura (1274), Frei Jacopone de Todi (1306), ao Papa João XXII (1334) e a Gregório XI (1378). Até hoje não é consensual qual destas figuras a terá concebido, apesar do Papa Bento XIV o ter atribuído a Inocêncio III. O culto a Nossa Senhora das Dores, apesar de já ser prática da devoção popular da Igreja Católica, foi solenemente integrado no Breviário a 22 de Agosto de 1725, sendo dois anos depois estendido a toda a Igreja com a oficialização da Festa de Nossa Senhora das Dores no calendário litúrgico. O Papa Pio X fixaria a Festa no dia 15 de Setembro. Em Braga esta devoção foi assumida a partir de 14 de Janeiro de 1761, momento em que foi solenemente benzida a imagem de Nossa Senhora das Dores na Basílica dos Congregados por intermédio do Arcebispo D. Gaspar de Bragança. Segundo o memorialista Senna Freitas, a comunidade dos Oratorianos de S. Filipe de Neri, sediada naquele templo, foi mesmo responsável por uma ampla divulgação desta devoção na Arquidiocese de Braga e desta para algumas regiões do Brasil, onde ainda hoje se mantêm, como é o caso de Vila Rica em Minas Gerais. Terá sido uma iniciativa do Padre Martinho Pereira, mentor da Irmandade de Nossa Senhora das Dores ainda hoje ereta na Basílica dos Congregados. Detendo o culto a Nossa Senhora das Dores um particular centro difusor na cidade de Braga, naturalmente que os conteúdos narrativos que lhe estão associados facilmente seriam divulgados entre as corporações religiosas bracarenses. Sabemos que a Igreja do Pópulo e a Igreja do Carmo adotaram este culto nos seus templos, reproduzindo similar cerimonial ao que havia sido instituído no templo dos Oratorianos. Apesar das diferenças estéticas expressas por estas devoções marianas, ambas integram o mesmo ideário cultual. Nossa Senhora das Dores é representada sentada e com sete espadas sobre o peito. Nossa Senhora das Angústias (ou da Soledade) está de pé e detém apenas uma espada sobre o coração. Cada uma das espadas detém um particular simbolismo instituído segundo a devoção popular: 1.ª dor – A Angústia de Nossa Senhora no momento da profecia de Simeão 2.ª dor – O Temor de Nossa Senhora aquando da fuga para o Egipto 3.ª dor - O Desamparo que experimentou quando perdeu o seu fiho no Templo 4.ª dor – A Amargura que sentiu quando contemplou o seu filho a caminho do Calvário 5.ª dor – A Agonia que teve quando seu filho expirou pregado na cruz 6.ª dor – A Aflição que sentiu quando lhe colocaram o corpo de Jesus nos braços 7.ª dor – A Soledade em que ficou quando depuseram o seu filho no túmulo Foi partindo deste ideário que se foram instituindo corporações religiosas centradas nesta devoção. As práticas devocionais que lhe estavam associadas expressavam naturalmente este ideário, nomeadamente as procissões e as celebrações pascais em que era solenizada a excisão de cada uma das espadas às imagens de Nossa Senhora das Dores. Tendo-se desenvolvido uma Irmandade devotada a Nossa Senhora das Angústias na Igreja de S. Victor e tendo esta registado um crescimento exponencial no momento em que se fundiu à Confraria de Santiago do mesmo templo, corporação que agrupava os sombreeiros, este ideário devocional acabaria por alcançar dimensão. À imagem de Nossa Senhora das Angústias iria juntar-se uma outra imagem da mesma feitura e tamanho em meados do século XIX, oferecida pelo Reverendo Tomaz José de Carvalho, pároco de S. Victor, que representava Nossa Senhora do Egipto, em memória da segunda dor de Nossa Senhora. Esta imagem, devidamente articulada para uso processional, estava trajada de forma similar à imagem de Nossa Senhora das Angústias e envergava ainda um chapéu, adereço preferencial do ofício dos sombreeiros que passaram a integrar a Irmandade. Segundo foi possível apurar, em 1877 já a Procissão da Senhora das Angústias integrava, além do andor da padroeira, uma outra imagem “montada n’uma jumentinha”. A adoção de um imaginário vinculado aos sete episódios da vida de Maria irmanados com as suas “dores” é inequívoca face aos dados disponíveis. As duas imagens marianas transportadas processionalmente seriam o complemento devocional a esta narrativa, que deveria estar devidamente plasmada nos quadros de “anjinhos” que a procissão integrava. O povo, afeiçoando-se a este quadro, acabou por progressivamente designar este préstito como “Procissão da Senhora da Burrinha”, facto sublinhado pela citação de Camilo Castelo Branco na sua “Brasileira de Prazins”. A popularidade da procissão conduziu a que fosse realizada com frequência até à primeira década do século XX, registando-se diversas notas informativas sobre a realização desta procissão na imprensa local, embora sem um destaque desmesurado. Sabemos que em alguns anos da primeira década do século XX a procissão não se realizou, nomeadamente em 1904, facto que poderá induzir uma quebra na periodicidade da procissão. A partir de 1910 o cenário não seria favorável. A implantação da República, como sabemos, acabou por burocratizar a realização de atos públicos religiosos e este facto terá sido dissuasor da realização desta e de outras procissões, além de ter provocado um menor empenhamento neste género de corporações religiosas da parte dos ilustres e influentes da sociedade bracarense de então. Após 1910 a Procissão da Senhora das Angústias regista duas ocorrências, em 1923 e em 1946, mantendo ainda a primeira ou a segunda dominga de Julho como data. Em ambas as ocasiões se mobilizou a comunidade paroquial em peditórios, tendo inclusive sido criada uma Comissão de Honra onde era registada a anuência das figuras mais proeminentes da freguesia de S. Victor. Em 1946 um dos primeiros nomes a figurar nesse ilustre rol é precisamente o de António Maria Santos da Cunha, que assumiu igualmente a presidência da Comissão Organizadora da Procissão. Este facto é significativo se considerarmos o papel que este viria a ter como Presidente da Câmara Municipal de Braga entre 1949 e 1961. Foi precisamente neste período que se registou pela primeira vez a integração da Procissão de Nossa Senhora das Angústias no programa da Semana Santa. Segundo se supõe, terá sido o Secretariado Nacional de Informação a estrutura institucional do Estado Novo a requerer a criação de uma iniciativa no Sábado Santo, de forma a complementar a programação oferecida aos turistas durante a Semana Santa de Braga. Dada a vinculação do imaginário da Procissão da Senhora das Angústias, onde eram por norma explorados os episódios das sete dores de Maria, e óbvia que era a ligação do então responsável da edilidade a esta iniciativa e à paróquia que a realizava, não é desprovido de razoabilidade afirmar que terá sido Santos da Cunha a sugerir tal resolução ao SNI. A integração desta procissão no programa da Semana Santa de Braga tem a sua primeira menção no programa oficial das Solenidades em 1960, tendo a partir desse ano decorrido ininterruptamente até 1973 na noite de Sábado Santo. O facto de se antepor à realização da celebração da Vigília Pascal, cujo vigor litúrgico foi fortalecido pelo Concílio Vaticano II, além das naturais motivações turísticas e propagandísticas, acabaram por comprometer a sua continuidade. O ideário da procissão e a sua designação era a mesma. Isso mesmo é passível de ser averiguado em um dos programas das Solenidades da Semana Santa de Braga, onde se descreve a constituição da procissão. “Sete cavaleiros, envolvidos em túnicas negras, conduzem cada qual a sua espada figurando as sete dores de Maria: 1– Profecia do Santo Velho Simeão; 2- Fuga para o Egipto; 3- Perda de Jesus aos 12 anos no Templo; 4- Encontro com Jesus a caminho do Calvário; 5- Agonia de Jesus na cruz; 6-Lançada que lhe rasgou o lado; 7- Sepultura de Jesus”. Acompanhando cada um destes quadros seguiam filas de farricocos trajados de negro e empunhando lampadários ainda hoje utilizados na Procissão da Burrinha. Acompanhando estes quadros seguia Nossa Senhora do Egipto em cima da burrinha e o andor de Nossa Senhora das Angústias, fechando o préstito. O trânsito da procissão fazia-se entre a Igreja de S. Victor e a Igreja da Misericórdia, através do largo da Senhora-a-Branca, avenida Central e rua do Souto. Sempre invocada na memória dos bracarenses, acabou por se enraizar o desejo de reativar esta procissão novamente enquadrada nas Solenidades da Semana Santa no ano de 1998. Dada a ausência de informações ou estudos mais aprofundados sobre esta temática, a paróquia juntamente com a Junta de Freguesia de S. Victor iniciaram conversações tendo em vista a reintrodução desta tradição. Dada a impossibilidade de se realizar no Sábado Santo como se tornou costume, foi aventada a possibilidade de se realizar na noite de Quarta-Feira de Trevas. Contando com o importante impulso do Bispo Auxiliar D. Jorge Ortiga, que em 1999 haveria de ascender ao título de Arcebispo, a paróquia fez avançar a ideia por intermédio do seu então pároco Monsenhor Joaquim Morais. Deixando de lado o ideário devocional de Nossa Senhora das Dores, que tinha presidido ao fundamento deste préstito, foi deliberado desenvolver esta iniciativa em torna da narrativa da história da Salvação, desde Abraão até Jesus Cristo, passando pela evocação da primeira Páscoa e pelos personagens mais relevantes do Antigo Testamento. Um dos últimos quadros repete a tradicional Fugida para o Egipto, com a representação de Nossa Senhora do Egipto em cima do jumentinho. A procissão passou a designar-se Cortejo Bíblico “Vós sereis o meu povo”, abandonando a configuração formal dos préstitos religiosos, onde não consta o presbitério, pálio e demais manifestações sacro-litúrgicas. A adesão significativa dos bracarenses a este cerimonial acabou por garantir a sua continuidade. Apesar do seu carácter original, existe uma outra Procissão da Burrinha na vila de Mafra cuja origem e fundamento é similar à de Braga. Também na Póvoa de Varzim, a procissão de Nossa Senhora das Dores integra o quadro da Fugida com um jumento, entre as restantes invocações das dores de Nossa Senhora. PROCISSÃO DO SENHOR ECCE HOMO: Uma das manifestações mais significativas que compõem o programa das Solenidades da Semana Santa de Braga é a procissão do Senhor “Ecce Homo”, popularmente conhecida como a procissão do Senhor da Cana Verde ou dos Fogaréus. Saindo às ruas na noite de Quinta-feira Santa, recorda o julgamento de Cristo quando Pilatos, dirigindo-se à multidão, proclamou: “Eis o Homem”, que em latim se pronuncia “Ecce Homo”, daí o nome dado à imagem que é transportada solenemente neste préstito. O dia de Quinta-Feira Santa marca o início do tríduo de preparação para a Páscoa, o momento central de todo o calendário cristão. Os sinos são silenciados – daí o uso das matracas – os santos óleos são benzidos durante a Missa Crismal, dá-se a comunhão geral reservando-se uma hóstia para adoração, desnudam-se os altares, esvaziam-se os sacrários. Inicia-se o tempo do silêncio e da introspeção. Os pecadores são chamados ao arrependimento e à penitência. A origem e fundamento desta procissão deriva precisamente das tradicionais penitências aplicadas aos fiéis durante a Semana Santa. Tratava-se, portanto, de um préstito de penitentes que percorria as ruas em orações e lamentos na noite de Quinta-Feira Santa. Disciplinando-se, carregando troncos ou pesados ferros, arrastando os joelhos pelo pavimento ou simplesmente acompanhando em oração, os penitentes compunham o corpo do préstito, preenchido pelos Irmãos encapuçados que auxiliavam as dores e fragilidades daqueles que sucumbiam ao peso das suas penas com água, doces ou tratando das feridas no final da procissão. O imaginário ainda hoje é marcado pelo negrume das trevas, numa espécie de apelo ao arrependimento pelos males praticados ou cogitados. No preciso dia em que é recordado o julgamento de Cristo às mãos de homens ímpios, os cristãos são chamados a colocar-se diante do justo Juiz e a pedirem também a sua pena. Os farricocos (ou fogaréus), ainda hoje integrados na procissão, são a personificação dos penitentes que ao longo dos séculos integraram esta manifestação. Esta procissão tem uma origem bem recuada. Será provavelmente a mais antiga das procissões que, por esta época, se realizam na cidade de Braga. A sua integração nas práticas religiosas está certamente associada à fundação das Misericórdias em Portugal, o que aconteceu a partir dos finais do século XV, sob a égide da Rainha Dona Leonor. Em Braga sabemos que no século XVII já a Misericórdia organizava esta procissão como no-lo comprovam as deliberações constantes na documentação dessa época. A referência mais antiga encontrada recua ao ano de 1628, constando formalmente no Compromisso da Misericórdia de Braga desse ano: “Quinta-Feira de Endoenças pela manhã quando se houver de tirar o Senhor do Sepulcro, fazendo-o a casa pelo tempo adiante, ” No entanto, dado que a instituição já havia sido fundada pelo menos desde 1513, é plausível considerar que esta procissão já se realizasse, dado o seu cariz penitencial e pelo facto de se constituir como uma das obrigações estatutárias integradas no documento fundador da Misericórdia de Lisboa, que acabou por modelar todas as outras Misericórdias instituídas inclusive a de Braga. Aliás, se percorrermos a história das Misericórdias existentes em território nacional encontraremos certamente referências à Procissão penitencial de Quinta-Feira Santa, sendo que muitas localidades, à imagem do que sucede em Braga, ainda mantêm viva essa tradição. O documento que regeu as primeiras décadas de existência da Misericórdia bracarense foi certamente o Compromisso da Misericórdia de Lisboa de 1516, dada a proximidade desta data com a fundação presumível da congénere bracarense. No mesmo documento estão vertidas as diretrizes pelas quais se deveriam reger os membros desta corporação muito favorecida pelo Arcebispo D. Diogo de Sousa (1505-1532). No que diz respeito a Procissão de Quinta-Feira Santa está disposto o seguinte: “Eram obrigados os ditos Irmãos vir à casa da dita Confraria (…) por dia de Quinta-Feira d’Endoenças para a procissão dos penitentes que se faz pela cidade: vindo visitar o Santo Sepulcro onde o Senhor estiver” Este dado torna-se relevante se o enquadrarmos no âmbito das obrigações anuais dos Irmãos das Misericórdias que se reduziam a três ocasiões: dia da Visitação de Nossa Senhora, Quinta-Feira de Endoenças e dia de Todos os Santos. Seria difícil que a nascente Misericórdia de Braga se escusasse ao cumprimento das práticas devocionais instituídas pela Casa Mãe da instituição. Por isso mesmo, a origem da procissão situar-se-á seguramente no primeiro quartel do século XVI. Desconhecemos a forma da mesma, todavia possuímos um dado relevante no âmbito de uma outra manifestação devocional ainda hoje prevista no programa das Solenidades da Semana Santa em Braga que é a visita às igrejas. A Procissão das Endoenças tinha como objetivo reunir os penitentes tendo em vista o exercício das suas penas públicas, organizando-se o percurso, não arbitrariamente pelas ruas mais importantes das localidades, mas seguindo um itinerário definido pelas igrejas onde o Santíssimo Sacramento se encontrasse exposto no “Santo Sepulcro”. Como sabemos, a liturgia recomenda que, após a celebração da Ceia do Senhor que se inaugura o Tríduo Pascal na Quinta-Feira Santa, se desnude o altar e se encerre a reserva eucarística. Convém recordar que no século XVI muitos templos ainda não possuíam sacrário. Na cidade de Braga esta problemática foi inclusive levantada pelo Arcebispo D. Frei Agostinho de Jesus (1588-1609) já no final da centúria. Este costume estava comprometido pelo facto de na cidade de Braga apenas existir reserva eucarística na Sé. O Arcebispo, angustiado pelo facto de existirem igrejas em que “se não fazia sepulcro nas Endoenças”, ordenou que se fizesse sacrário nas demais paroquiais da cidade Primaz, “d’onde deve derivar o exemplo do culto divino para as outras partes”. Não sabemos até quando perdurou a tradição da visita às igrejas ao longo do préstito, mas é costume inequivocamente vinculado à sua introdução nas dinâmicas do Tríduo Pascal na cidade de Braga. A designação da procissão encerra igualmente um conjunto de significados, detendo diversas versões, inclusive na cidade de Braga. Muitos bracarenses apelidam a procissão de “Senhor da Cana Verde”, aludindo à imagem transportada no percurso. A instituição organizadora designa a procissão de “Senhor Ecce Homo”, mas também esta designação é discutível do ponto de vista iconográfico. Para a iconografia cristã a imagem transportada nesta e noutras procissões designa-se “Senhor da Coroação”, dado que o Ecce Homo é representado geralmente de pé com o manto púrpura sobre o dorso e com as mãos atadas. Outra das denominações é “fogaréus” numa alusão direta aos artefactos de iluminação que deveriam acompanhar esta procissão que deveria realizar-se “depois do sol posto”. Além destas designações, a procissão de Quinta-Feira Santa organizada pelas Misericórdias é também chamada em muitos lugares de procissão das Endoenças, um termo que se foi popularizando desde o século XV e que é uma adaptação vocabular da palavra “indulgências”, aludindo às indulgências concedidas pelos sucessivos Papas a quem cumprisse as práticas penitenciais associadas ao Tríduo Pascal. Subsiste ainda uma outra designação para esta procissão: “Mandato”. Este termo aponta para a liturgia associada à Quinta-Feira Santa, mormente o tradicional momento do Lava-Pés em que se memora o mandato que Jesus Cristo concedeu aos seus discípulos: “Dou-Vos um Mandamento Novo”. Em alguns lugares a procissão é também designada de “Procissão dos Painéis” dado o tipo de estandartes utilizado pelas Misericórdias, onde se exibem telas com forma quadrangular. Enraizada nas cadências da Semana Santa bracarense, esta procissão foi atravessando as eras, conservando o seu cariz penitencial até à dobra do século XX. Depois do tema ter sido abordado no ano de 1775, em 1781 foi deliberado não integrar os fogaréus na procissão, num período em que estes aproveitavam o anonimato para efetuar denúncias públicas das pessoas que assistiam à passagem da procissão. A decisão foi revogada em 1795, mas haveria de repetir-se, pelos mesmos motivos, em 1828 e em 1863. Anos mais tarde, em 1764 nova divergência surge. Os estatutos obrigavam à realização da procissão às 20 horas, mas o provedor de então entendeu que se deveria realizar às 16 horas. O caso foi revertido nos anos imediatos, voltando a procissão a realizar-se às 20 horas. No que diz respeito ao percurso sabemos que o percurso vertido no já citado Compromisso de 1628 intima a procissão a “entrar na Sé pela porta de S. Geraldo e tomando os claustros entrará outra vez na Sé e sairá pela porta principal”. Daí seguiria pela rua Dom Gualdim até à porta de Santiago, seguindo-se a rua do Anjo, rua de S. Marcos, Porta do Souto e rua do Souto, entrando na porta principal da Sé novamente através da atual rua do Cabido, efetuando um circuito muito similar ao atualmente adotado. PROCISSÃO DO ENTERRO DO SENHOR: A Sexta-Feira Santa, celebração móvel em que os cristãos recordam a paixão e morte de Jesus Cristo, constitui-se como dia de maior relevo para as solenidades da Semana Santa de Braga. Isso mesmo aparece devidamente exposto na documentação disponível, particularmente nas deliberações da Irmandade de Santa Cruz, responsável primeira pela Procissão do Enterro, mas ainda em curiosas partilhas deixadas por memorialistas bracarenses. Sobre a Procissão do Enterro, que presentemente resulta de uma organização do Cabido e Irmandades da Misericórdia e Santa Cruz, temos a informação que entre o último quartel do século XVII, época em que se terá começado a organizar, e o início do século XIX era organizada apenas pela Irmandade de Santa Cruz. As primeiras informações podem ser encontradas no Livro de Estatutos da Irmandade de Santa Cruz do ano de 1702. Aí se diz que “se tem introduzido o fazer-se uma Procissão do Enterro sem que fosse por disposição de Estatuto”, facto lamentado na mesma disposição. Significa isto que a procissão começou a organizar-se ainda no século XVII, dado ter começado a organizar-se nos anos anteriores a 1702, e que terá sido introduzida nas dinâmicas da Irmandade sem uma instituição formal. A forma espontânea da sua introdução poderá induzir que não se trataria de uma iniciativa exclusiva de Braga, mas que terá plausivelmente sido “importada” de localidades onde já se realizava. Em apenas 18 anos o cenário haveria de mudar e consta na revisão dos estatutos “que se faça a Procissão do Enterro na sexta-feira Santa na forma e devoção como que se costumava fazer todos os anos”. É bem provável que a procissão tenha deixado de se realizar após 1702, todavia a Irmandade, em reconhecimento da importância deste cerimonial na vivência da Sexta-Feira Santa, tenha fomentado a sua realização. Segundo consta no capítulo XXXIII dos mesmos estatutos, o objetivo da oficialização da procissão do Enterro nas dinâmicas da Irmandade de Santa Cruz devia-se à prática devocional já citada nos estatutos de 1664 de celebrar os Passos da Paixão em cada sexta-feira da Quaresma no interior do templo de Santa Cruz. A propósito desta vivência quaresmal dos irmãos de Santa Cruz, o Dicionário Geográfico do Padre Luís Cardoso, compêndio datado de 1758, refere, que “nas sestas feiras da Quaresma se expoem (na igreja de Santa Cruz) o Santo Lenho, e há Sermão, em que se mostra huma das Imagens, principiando pela do Horto”. Associando este dado à organização interna do templo da Irmandade de Santa Cruz – representações retabulares da figura de Cristo nos sucessivos episódios da sua Paixão, num crescendo dramático desde a oração no Getsémani até à morte na Cruz – percebemos a importância da vivência quaresmal na missão desta Irmandade bracarense. Em 1762 a Mesa ordena que “de uma a outra procissão mediarão dois anos livres” em virtude da”grande despesa que com ela faz a Irmandade”. Esta deliberação é acompanhada de avisos face ao desrespeito para com este normativo, que implicariam que os próprios Irmãos pagassem a procissão do seu próprio bolso. Os estatutos de 1773 manteriam os receios quanto às despesas implicadas neste cerimonial, fortalecendo a necessidade de não ser anual a sua realização. A forma da Procissão aparece citada no mesmo Dicionário Geográfico. Segundo esta fonte, a procissão decorria “de noite, com Sermão no fim, em que se mostra o Santo Sudario”, acrescentando que “neste Reino se não faz outra com mais devoção, nem com tanto aceio”. Este facto é sublinhado também pelo autor do Livro Curioso, que menciona que a procissão do Enterro de 1770 se realizara “com todo o asseio como he costume”. Um outro apontamento, desta feita de João Luís Jácome, indica-nos o percurso da procissão no ano de 1803. Partindo de Santa Cruz em direcção ao Campo de Santana, tomou o “Campo da Vinha, e se abrigou nas Igrejas do Salvador, e Popello, e veio pella rua nova asima, rua de S. Marcos, e recolherce a Santa Crus”. Neste ano, a procissão foi obrigada a recolher-se em dois templos da cidade devido à chuva, que também importunou as celebrações relativas ao ano de 1770. Demais informações a respeito deste préstito, o mais solene e lúgubre da Semana Santa bracarense, podemos encontrá-las no Arquivo da Irmandade de Santa Cruz, particularmente descritas no Livro de Estatutos de 1773. A procissão do Enterro deveria conduzir uma urna com a imagem de Cristo morto, juntamente com a imagem de Nossa Senhora da Soledade transportada num andor. O restante figurado seria composto pelos estandartes da corporação, juntamente com os figurantes representando São João Evangelista, Maria Madalena, o Centurião, soldados romanos, anjos e profetas, os mesmos que se integravam na representação do Descimento da Cruz. A informação mais relevante a propósito dos cerimoniais públicos realizados na Sexta-Feira Santa em Braga refere-se a uma cerimónia designada do "Descimento da Cruz" que antecedia a Procissão do Enterro. Este género de encenações, representadas ainda em algumas localidades portuguesas, consiste na teatralização da morte de Cristo seguida da remoção do seu corpo desde a Cruz. Em Braga também se realizou em algumas ocasiões “com toda a grandeza” e contando com a concorrência de “muita gente de fora de longe”. Sabemos que se realizou em 1729, 1760, 1770 e 1803, dado que os memorialistas bracarenses o deixaram claramente exposto nos seus escritos. Sabemos também que entre os anos de 1729 e 1760 a mesma encenação não se realizou, bem como entre 1760 e 1770. A relevância da encenação, os meios que implicava e, até, o número de “forasteiros” que atraía, são dados sublinhados em três manuscritos do Arquivo Distrital de Braga. O local escolhido para levar a efeito o Descimento da Cruz era preferencialmente o pátio frontal da igreja de Santa Cruz, dado que a organização pertencia à Irmandade de Santa Cruz. Em 1760, após 31 anos de interregno, a encenação foi levada a efeito “com muita decencia e gravidade”, tendo a representação contado com “43 figuras”. A mesma crónica informa-nos que o ato, que deverá ter despendido muitos meios, resultou da iniciativa do Juiz da Irmandade vigente, o abastado João Duarte Faria, o mesmo que mandou construir o magnificente Palácio do Raio. O desembargador, responsável por este manuscrito, na sua descrição do Descimento da Cruz sublinha particularmente o facto da mesma não se realizar “havia trinta e hum annos”. A dinâmica do seu Juiz-Provedor terá sido, porventura, decisiva para o retomar desta encenação, que marcava sobremaneira as celebrações de Sexta-Feira Santa. A mais alongada descrição desta tradição pascal bracarense vem, contudo, expressa no “Diário e Livro de Razão de João Luís Jácome”, informando-nos, desde logo, de uma nova localização da mesma. Realizou-se, na tarde de “8 de Abril de 1803 dia de Sesta feira da Paixão do Senhor”, no então Campo de Santana (atual Avenida Central), no espaço que intermediava a Torre dos Congregados e o Recolhimento das Convertidas. A importância desta organização estava bem patente na logística aplicada no dito campo: uma elevação em forma de monte, onde decorreu a encenação, e palanques junto às casas com o intuito de acolher a numerosa assistência aguardada. Segundo o testemunho deste fidalgo da Casa do Avelar, a encenação arrastou inúmeros forasteiros a Braga, entre os quais se encontravam “famílias nobres”. Se encheu“todo o dito Campo e janellas de gente, athe à Senhora da Lapa, cruzeiro do heirado, e porta do Souto, e se julgou serem mais de quarenta mil pessoas que alliestavão”, refere ainda. Este dado é complementado com a informação de que esse dia contou com “muito frio” e “chuveiros”. Apesar disso, a multidão não dispersou. Quanto à encenação em si, sabemos que estavam vestidos “com a maior riqueza” os Profetas, S. João, a Madalena, as Marias e o centurião, tal como os Anjos e os soldados. A encenação partia em cortejo desde a igreja da Lapa até à elevação montada no meio do Campo de Santana. No final da representação se pronunciava um sermão, facto que já se verificara em 1770. A magnitude da iniciativa aparece atestada também pelo reforço de segurança que implicou. No testemunho se refere que “vieram soldados de Viana” para “arrumar” o povo. Tanto a Procissão do Enterro como o Descendimento da Cruz foram deixando de se realizar no primeiro quartel do século XIX, facto a que não estará alheio o grande investimento necessário e a instabilidade social que a cidade e o país atravessaram nesse período. Ausente na segunda metade do século XIX, a procissão seria reintroduzida nas dinâmicas da Semana Santa de Braga na década de 1930, confirmando a crescente afirmação deste momento do calendário bracarense. Passou a sua organização a ser responsabilidade partilhada pelo Cabido, Irmandade de Santa Cruz e Irmandade da Misericórdia. Substituindo o Sermão da Soledade que costumava preencher o serão de Sexta-Feira Santa, chegou a implicar uma solene trasladação da imagem de Nossa Senhora da Soledade entre Santa Cruz e a Sé na tarde de Sexta-Feira Santa e, na década de 1960, chegou a integrar um andor de S. João Evangelista. Atualmente é o mais imponente e participado cerimonial público integrado nas Solenidades da Semana Santa de Braga.
  • Direitos associados :
  • TipoCircunstânciaDetentor
    Consuetudinário LocalObservando-se que existe uma prática reiterada e constante do conjunto de manifestações que integram a Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga, que implica a criação de um imperativo psicológico junto da comunidade para a sua continuidade, o direito relativo a esta prática é de natureza coletiva e carácter consuetudinário. Não se encontrando consagrado legalmente a realização e salvaguarda das manifestações que integram a Quaresma e Solenidades da Semana Santa de Braga, algumas das suas práticas encontram-se salvaguardadas nos imperativos estatutários de algumas das entidades responsáveis, nomeadamente da Santa Casa da Misericórdia, Irmandade de Santa Cruz e Cabido da Sé. O carácter consuetudinário destas manifestações acaba por fundar na população bracarense uma apropriação moral das manifestações mencionadas. Comunidade em Geral
  • Responsável pela documentação :
    Nome: Rui Manuel Gomes Ferreira
    Função: Investigador em Património Cultural e Assessor do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Braga
    Data: 2016/09/09
    Curriculum Vitae
    Declaração de compromisso
  • Fundamentação do Processo : ver fundamentação do processo
Direção-Geral do Património Cultural Secretário de Estado da Cultura
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