Ficha de Património Imaterial

  • N.º de inventário: INPCI_2021_001
  • Domínio: Expressões artísticas e manifestações de carácter performativo
  • Categoria: Manifestações artísticas e correlacionadas
  • Denominação: Equitação Portuguesa
  • Outras denominações: Equitação Tradicional Portuguesa, Arte Equestre Portuguesa ou Arte de Marialva
  • Contexto tipológico: A Equitação Portuguesa é uma prática que se traduz na excelência do ensino do cavalo expressa na realização dos andamentos e ares de alta escola, que deriva do ensino praticado nas academias de arte equestre europeia, com particularidades que a distinguem, fundamentalmente as que advêm da equitação de trabalho de alaceamento e lide do touro, em campo ou em arena, ou nos jogos equestres.

    O ensino do cavalo é centrado no aperfeiçoamento do tacto equestre e desempenho do conjunto cavalo/cavaleiro, por forma a permitir a realização dos movimentos do cavalo, expressando destreza, perfeição e beleza dos andamentos, transições e ares altos.

    Encontra-se plasmada no trabalho realizado desde o século XVIII na Real Picaria, tendo atingido uma difusão contínua que chegou aos nossos dias e congrega numerosos indivíduos e grupos de praticantes.

    A Equitação Portuguesa, a qual é objeto do presente pedido de inventariação, é apenas uma parte da equitação que se pratica em Portugal. É desenvolvida por determinados grupos e indivíduos e tem no Puro-Sangue Lusitano a raça, entre todas as outras, mais apropriada para a sua realização.
  • Contexto social:
    Indivíduo(s): Cavaleiros praticantes da EP
  • Contexto territorial:
    Local: Distritos: Aveiro; Beja; Braga; Castelo Branco; Coimbra; Évora; Faro; Leiria; Lisboa; Portalegre; Porto; Santarém; Setúbal; Viana do Castelo.
    País: Portugal
  • Contexto temporal:
    Periodicidade: Qualquer dia, qualquer hora, qualquer altura do ano é propícia à prática da Equitação Portuguesa podendo, por isso considerar-se que é uma prática sistemática e continuada.
    Data(s): Não aplicável
  • Caracterização síntese:
    A Equitação Portuguesa é uma prática equestre contemporânea exaltada pela utilização do Cavalo Puro-sangue Lusitano, o qual confere a esta arte o seu virtuosismo e principais singularidades que possibilitam a sua execução. Constitui uma das mais importantes práticas equestres portuguesas, a par de outras realidades equestres e ainda de outras associadas às demais raças portuguesas.

    A Equitação Portuguesa, Arte Equestre Portuguesa ou ainda, Arte de Marialva funda-se em iniciativas individuais e/ou coletivas que ao longo de séculos e gerações foram sendo transmitidas, reproduzidas e readaptadas fazendo chegar até aos dias de hoje um riquíssimo legado cultural que se impõe salvaguardar e valorizar e, em última instância, perpetuar. Desde a fundação da nacionalidade se conhecem práticas equestres de utilização do cavalo, sobretudo na equitação de guerra, havendo hoje em comum com esta o trabalho de aperfeiçoamento da destreza, dentro dos clássicos princípios da conjugação do binómio cavalo-cavaleiro, expressando-se no que o Mestre Nuno Oliveira (1925-1989) definia, como basilar no trabalho do cavalo: Cadência, ligeireza e impulsão.
  • Caracterização desenvolvida:
    «Criámos e selecionámos um tipo de cavalo – o lusitano – de características próprias; mantivemos uma equitação de combate (na tauromaquia); praticámos uma equitação académica de finalidade artística e, simultaneamente uma peculiar equitação popular.» (Costa, 1997: 5).


    A Equitação Portuguesa tem por finalidade o ensino e o adestramento do cavalo, para funcionamento em perfeita harmonia do binómio cavalo/cavaleiro, para que todas as ajudas (indicações transmitidas ao cavalo pela mão – rédeas – pelas pernas, pela posição e oscilação do peso do cavaleiro, pela vara, ou rédeas longas ou, por vezes, pela voz) o levem a executar com ligeireza, cadência e impulsão um conjunto de andamentos e transições – passo, trote, galope e recuar, na chamada baixa escola, para depois poder executar os ares e andamentos de alta escola, sendo após o ensino da primeira que o cavalo é adestrado e preparado para a execução dos exercícios de alta escola, treinando a reunião dos seus membros para uma concentração da sua base de apoio, sem perder a impulsão, permitindo-lhe passar aos andamentos e ares da alta escola:
    Passage, trote com ligeira amplitude e altura do andamento;
    Piaffe, trote no mesmo terreno cadenciado;
    Passagens de mão a galope a tempo, até ao ensino dos ares altos;
    Levada, elevação do cavalo colocando o peso nos posteriores ligeiramente fletidos;
    Pousada, semelhante à Levada, mas com os membros posteriores menos fletidos, dando maior elevação à figura;
    Curveta, salto executado a partir da posição da Levada;
    Capriola, o cavalo eleva-se sobre os membros posteriores fletindo os curvilhões, saltando e distendendo os membros para trás, formando a figura e atitude de um cavalo “alado” com o tronco suspenso em posição horizontal;
    Balotada, a partir do piaffe o cavalo dá um salto com os membros fletidos debaixo do tronco;
    Rédeas Longas, trabalho que demonstra o bom ensino e entrega do cavalo nos andamentos, exercícios de flexão, ladeares, passagens de mão, piruetas e piaffe, com uma cadência lenta e bem reunida que permite o cavalo ser conduzido à mão com as ajudas das rédeas longa e da vara, comportando-se tal como se fosse montado;
    Reverência, o cavalo ajoelha um dos seus membros anteriores e estende o outro para a frente, dobrando o pescoço posicionando e fletindo a cabeça, entre os membros anteriores. Era também designada como a “saudação à rainha”;
    Jambette, elevação de um membro anterior do cavalo.


    A caracterização da Equitação Portuguesa na perspetiva da dimensão intangível impõe a identificação e caraterização das expressões contemporâneas que corporizam este tipo de equitação e que se agrupam em função de características e formas de representação específicas e congéneres que não são, de modo algum, estanques entre si. Considerar, por um lado uma dimensão mais “erudita” ou canónica que representa uma arte equestre de tradição clássica, no seu esplendor, compilada nas grandes obras e nos grandes mestres tratadistas e, por outro, uma versão que ao longo das últimas décadas e por condicionantes de natureza histórica, se democratizou e se popularizou e que tem a sua expressão máxima naquela que hoje se considera uma “equitação de lazer”.
    Associada a estas duas representações da equitação de tradição portuguesa – erudita e popular – e igualmente fruto de séculos de história de Portugal, a equitação tauromáquica ou tauromaquia equestre inscreve-se neste contexto como a prática cultural que veio assegurar a continuidade da Equitação Portuguesa quando a partir dos finais do século XVII-XVIII a tática militar a dispensou.
    Se a Equitação Portuguesa se tornou nas últimas décadas maioritariamente uma equitação popular, resultado da sua democratização e novas reorientações que a sociedade humana moderna conheceu na relação com o trabalho e com o surgimento dos hábitos de lazer, manifesta-se cada vez mais restrito o universo daqueles cuja única, ou principal ocupação profissional, decorre da utilização do cavalo. A tauromaquia equestre que tem em Portugal a maior representatividade no mundo inteiro mantém esta particularidade de associar a sobrevivência de uma atividade profissional, exclusiva ou não, à utilização do cavalo.
    O estado atual da Arte Equestre Portuguesa resulta da combinação e interligação entre permeáveis práticas sociais e culturais, historicamente fundamentadas e documentadas, que comungam, beneficiam e se exaltam pela utilização do Cavalo Lusitano e que resulta na forma como individualmente contribuem para a caracterização deste complexo cultural como um todo.
    Todo este património cultural está disseminado pelo território nacional e tem expressões variadas, desde as mais públicas e acessíveis, associadas a locais e espaços onde se pratica o ensino regular da equitação como Escolas, Academias, Picadeiros, Centros Hípicos, etc., às mais privadas e familiares onde o ensino se confunde com a prática, é mais ou menos inato, adquirido, continuado e perpetuado no seio de famílias tradicionais que preservam e reproduzem as tradições associadas à criação de cavalos de sela, em particular o Puro-sangue Lusitano (PSL). Amiúde, estas tradições coudélicas que se desenvolvem, quer em ambientes familiares quer em estabelecimento de ensino, redundam na utilização do Cavalo Lusitano para a prática de modalidades desportivas.
    Importa sublinhar que toda a equitação, incluindo a portuguesa, assenta num pressuposto básico e fundamental que em língua inglesa é mais facilmente traduzível por horsemanship. A relação cavalo-cavaleiro, funde-se num todo harmonioso e equilibrado, em termos físicos e psíquicos, que mediante um processo contínuo e duradouro, é a chave e o sucesso de toda a arte equestre. Parafraseando Fernando Sommer D’Andrade (2005) e acatando a ideia de que para os povos não ibéricos a equitação se refere apenas ao ato de “ir a cavalo”, i.e. “andar a cavalo”, em Portugal a expressão tem um conteúdo bem mais vasto que a qualifica enquanto a arte de comandar o cavalo, segundo a vontade do cavaleiro.
    Sendo o Cavalo Puro-sangue Lusitano o elemento possibilitador da Arte Equestre Portuguesa e o elemento agregador de todo o complexo cultural, social e artístico que a define, é incontornável considerar que a Feira de São Martinho (1571), na Golegã - Feira Nacional do Cavalo desde 1972 - é o expoente máximo e o ex-libris da sua promoção e divulgação. Uma das mais antigas, destacadas e ilustres feiras nacionais, a Feira de São Martinho representa, em si, todo o panorama equestre português e o princípio basilar de toda esta Arte - o cavalo, o seu ensino e a sua apresentação.
    A singularidade e principal elemento de distinção da Equitação Portuguesa assentam na utilização de um cavalo excecional por ser dotado de características únicas e exclusivas que o distinguem, pelo seu carácter e aptidão natural, na Arte Equestre. O «Cavalo Lusitano» ou «Puro-sangue Lusitano» é ramo do tronco étnico do Cavalo Ibérico, tal como o «Pura Raça espanhola», ou «Cavalo Andaluz» do qual se foi diferenciando progressivamente. Note-se que para a separação e apuramento das duas raças contribuíram fatores diversos, um deles decisivo que importa sublinhar e que está inequivocamente relacionado com a ininterrupta utilização do cavalo no toureio em Portugal contrariamente ao declínio que se verificou em Espanha a partir do século XVIII que se crê com a chegada dos Bourbon ao trono espanhol, em 1715.
    Pese embora algumas condicionantes que a história da tauromaquia em Portugal conheceu, esta foi decisiva na seleção da raça. Esta progressiva seleção acentuou e exaltou as características de um cavalo em que se destaca a submissão, maneabilidade e concentração. «Submissão» não uma forma de sujeição, mas como uma vontade colaborar, de certo modo intuindo a ação do cavaleiro; «maneabilidade» entendida como disponibilidade, flexibilidade e prontidão de resposta às ajudas e «concentração» de que decorrem as variações de ritmo e a facilidade em transitar rapidamente de um andamento curto e concentrado a um andamento largo e vice-versa. São estas suas características que definem a excelência do Cavalo Lusitano e o tornam propício ao desenvolvimento de uma equitação a ele exclusivamente destinada e apenas por ele possibilitada. Assim, não é impróprio admitir que a Equitação Portuguesa, Arte Equestre Portuguesa ou Arte de Marialva nasceu, em Portugal, como causa e consequência da existência deste cavalo, que a sugeriu naturalmente e por ela foi sendo continuamente aperfeiçoado (Cordeiro, 2005).


    Equitação Erudita


    A Equitação Erudita tem por base o conhecimento de regras e métodos de equitação, que ao longo dos tempos foram evoluindo, sendo desenvolvidos e aperfeiçoados por alguns mestres cavaleiros e conceituadas academias. Em Portugal e na sua componente erudita, a Arte Equestre é subsidiária do contributo de D. Pedro de Alcântara e Menezes, 4º Marquês de Marialva, Estribeiro Mor dos reis D. José e D. Maria I, tido como um dos maiores cavaleiros do seu tempo, e ainda hoje considerado como o “pai” da equitação clássica portuguesa. Por esse motivo a Arte Equestre Portuguesa, ou Equitação Portuguesa é também frequentemente apelidada como «Arte de Marialva». Os seus métodos, expostos na obra "Luz da Liberal e Nobre Arte da Cavalaria", assinada por Manoel Carlos de Andrade continuam, nos dias de hoje, a fazer parte da doutrina da equitação clássica em Portugal. Esta obra constitui o mais precioso e completo tratado de cavalaria da era do Antigo Regime e contém todos os ensinamentos da equitação os quais ainda hoje são preservados e reproduzidos em Portugal através do trabalho desenvolvido por alguns agentes e instituições nos mais variados contextos. Toma especial destaque o trabalho da Escola Portuguesa de Arte Equestre (EPAE) que preserva e reproduz, desde a Baixa Escola e os três andamentos básicos, à grandiosa Alta Escola com a reprodução dos exercícios praticados na Picaria Real, a academia equestre da corte portuguesa do século XVIII a quem estava confiado o Picadeiro Real de Belém, que depois de extinto veio a albergar, durante mais de um século, o Museu Nacional dos Coches.
    A Escola Portuguesa de Arte Equestre foi inaugurada em 1979 por iniciativa do Ministério da Agricultura, através de João Costa Ferreira, então diretor do Serviço Nacional Coudélico cumprindo assim o desígnio de Ruy d’Andrade, do seu filho Fernando Sommer d’Andrade e de outros tantos amantes da arte equestre que acreditavam ser possível recuperar o Museu Nacional dos Coches para picadeiro, recuperando a função para que fora construído. Na sua origem esteve um núcleo de alunos do Mestre Nuno de Oliveira, reconhecido e aclamado em todo o mundo como grande Mestre e cultor da Equitação Clássica, sagrando-se aluno de Mestre Joaquim Miranda, último Picador da Casa Real do qual era aparentado e de quem recebeu os primeiros ensinamentos. A este núcleo de cavaleiros, dirigidos inicialmente por Guilherme Borba e José d’Athayde e, posteriormente, por Filipe Graciosa foi incumbida a missão de promover, divulgar e ensinar a arte equestre tradicional portuguesa. A EPAE é hoje uma das principais depositárias desta tradição, que preserva através da reprodução dos exercícios praticados na Picaria Real, passage, piaffe, piruetas, passagens de mão a tempos aproximados, como também os “ares altos”, expoente máximo da Equitação Barroca - a alta escola dos séculos XVII e XVIII -, como as levadas, as pousadas, as corvetas, balotadas e capriolas.
    A EPAE é uma das quatro escolas de arte equestre existentes na Europa, a par com a Real Escuela Andaluza Del Arte Equestre, em Espanha; a Escola Espanhola de Viena na Áustria e o Cadre Noir de Saumur - École Nationale, em França. Distingue-se das outras escolas de arte equestre europeias, desde logo, pelo tipo de cavalo utilizado, o Puro-sangue Lusitano bem como pela influência do toureio equestre. Note-se que a Escola Portuguesa de Arte Equestre utiliza exclusivamente cavalos Lusitanos Alter Real (da Coudelaria de Alter) que como cavalos de Alta Escola se revelam uma mais-valia, já que a sua inteligência lhe permite uma aprendizagem rápida e constante.
    A EPAE funcionou na Sociedade Hípica Portuguesa, no Campo Grande e, em 1996, mudou-se para o Palácio de Queluz depois da construção, nos seus jardins, de novas cavalariças. Atualmente realiza espetáculos regulares abertos ao público no Picadeiro Henrique Calado na Calçada da Ajuda, em Lisboa. Como referido e devido à prática continuada do toureio equestre em Portugal, foi conservado até aos dias de hoje o mesmo tipo de cavalo utilizado no século XVIII, bem como a mesma equitação, os mesmos arreios e os mesmos trajes que no seu todo constituem réplicas da Real Picaria, extinta no século XIX.
    A Escola conta atualmente com 15 cavaleiros (distribuídos hierarquicamente entre as categorias de Mestre-Picador Chefe, Mestres-Picadores, Picadores, Picadores-Ajudantes, Aspirante e Alunos) e cerca de 50 cavalos, todos inteiros, sendo alguns utilizados como reprodutores da Coudelaria de Alter. Os cavalos são montados diariamente pelos cavaleiros que os acompanham desde os quatro anos, altura em que ainda poldros abandonam a Coudelaria e são integrados no efetivo da EPAE. Todo o trabalho conduzido pelos cavaleiros desde tenra idade dos cavalos intenta para que estes se tornem colaborantes, atentos e obedientes às ordens e solicitações do cavaleiro que ao longo dos anos lhes vai fazendo sobressair, através do aperfeiçoamento, as suas melhores aptidões conducentes à progressiva capacitação para a execução dos exercícios, dos mais elementares aos mais difíceis exercícios de Alta-Escola.
    O ingresso no corpo de cavaleiros da EPAE pressupõe comprovada experiência equestre e uma predisposição para desenvolvimento de competências e/ou aptidões individuais que os cavaleiros tendem, com o tempo, a aperfeiçoar perante a responsabilidade de preservar e divulgar esta tradição portuguesa. Cavaleiros e cavalos (de diversas idades) trabalham diariamente em conjunto dividindo a sua prestação, para fins públicos, entre treinos diários consubstanciados em apresentações matinais; apresentações semanais sob a forma de espetáculos com apresentação de exercícios de equitação clássica, e coreografias executadas por cavaleiros e cavalos ao som de música barroca e espetáculos de gala que incluem entre outros, os referidos “ares altos”, exercícios de equitação caraterísticos do período barroco, e jogos da corte, torneios praticados entre os séculos XVI e XIX, em ocasiões festivas.
    Pese embora lhe esteja associada uma forte componente de recreação e/ou encenação, há que sublinhar que a Escola Portuguesa de Arte Equestre promove, fundamentalmente, o ensino, a prática e a divulgação da Arte Equestre tradicional portuguesa, não descurando o ímpeto de o fazer na sequência do que foi a academia equestre da Corte portuguesa do século XVIII mas cujo ensinamento e tradição nunca deixou de influenciar a maneira de montar em Portugal. Constitui-se assim, tanto em Portugal como no estrangeiro, como um importante meio de preservação e divulgação do Cavalo Lusitano e, consequentemente, da Equitação Portuguesa.
    A prática deste tipo de Equitação que classificamos como «Erudita» e a preservação do estilo do séc. XVIII com a reconstituição da Picaria Real não se esgota, todavia, no trabalho desenvolvido por esta Academia. Destacam-se igualmente outros agentes, privados, que em Centros Equestres espalhados pelo país - como o já citado Centro Equestre da Lezíria Grande, em Vila Franca de Xira, propriedade de Luís Valença – em que se preserva e transmite a tradição da Arte Equestre Portuguesa na sua forma clássica ou erudita, fundamentalmente através do ensino, mas também através de outras formas de promoção e divulgação.


    Equitação Tauromáquica (ou Tauromaquia Equestre)


    Tendo em conta que a Arte Equestre Portuguesa se traduz sob distintas formas e heterogeneidades e que duas representações da equitação de tradição portuguesa – erudita e popular – são fruto de séculos de história de Portugal, há que considerar, neste contexto, a importância de uma Equitação Tauromáquica que se inscreve como a prática cultural que veio assegurar a continuidade da Equitação Portuguesa até aos nossos dias, desde o momento em que, nos finais do século XVII-XVIII, os exércitos a dispensaram por evolução da tática militar.
    Sem se pretender enveredar pelo aprofundamento histórico recorde-se, todavia, que a Picaria Real em Portugal, tal como as Reais Maestranzas de Caballaria em Espanha vão promover ao longo do século XVIII, espetáculos inicialmente palacianos e mais tarde públicos, onde se demonstravam, para gáudio da população, as capacidades equestres dos seus membros em jogos criados para o efeito entre os quais o alanceamento de touros que maior entusiasmo despertava, suplantando todos os outros (Costa-Ferreira, 2005). Em Portugal, e como consequência de ter perdurado e evoluído para o toureio equestre esta prática de alanceamento de touros tornou-o o fio condutor à sua popularização, motivo pelo qual a atividade subsiste, acompanhada de uma crescente preocupação estética e artística, após o abandono deste tipo de equitação nos cenários de guerra, dando lugar ao espetáculo da tauromaquia equestre que se desenvolveu sobretudo em Portugal, com as regras próprias, e uma essência em parte guerreira, em parte artística, assimilando os progressos da equitação clássica sem nunca perder a sua integridade de equitação de combate (Gonçalves, 2015: 25).
    O mesmo é dizer que os portugueses se interessaram pelo progresso da equitação explorando as reais possibilidades que esta oferece ao enriquecimento do ensino dos cavalos e, como tal, foram absorvendo todos os detalhes da equitação académica, de picadeiro, dando-lhe uso através da tauromaquia.
    Há que sublinhar que equitação tauromáquica não é sinónimo de equitação académica no seu sentido puro, todavia trata-se de uma atividade que a utiliza, realizando a baixa e alta escola inclusive alguns ares altos. O toureio a cavalo permite assim a aplicabilidade de muitos ensinamentos tratadísticos que, pela via do ensino/aprendizagem ou do experimentalismo, foram tendo neste pequeno reduto uma forma de sobrevivência. Manobras e exercícios específicos são executados pela dupla cavalo-cavaleiro à qual se exige a sincronização perfeita, perante a necessidade de enfrentar um touro bravo que à mínima falha desta dupla não perdoa, podendo causar danos lamentáveis a qualquer um deles ou, inclusive, a ambos.
    A influência da equitação clássica traduz-se na forma como se encabeça, desde logo, a aprendizagem do cavaleiro bem como, desde cedo, o ensino do cavalo que, amiúde, manifesta tendência natural, aos olhos dos mais conhecedores, para o toureio. O animal é treinado para que adquira força e equilíbrio em todos os andamentos e para que aprenda a deslocar-se ligeiro e flexível em duas ou mais pistas, ou seja, em todos os movimentos que exigem marchas laterais, como o quarteio, movimento que o cavalo executa envolvendo o touro. Tendo como base de ensino a escola de picaria o cavalo é treinado para realizar exercícios específicos como passage, piaffe, piruetas e passagens de mão a tempos aproximados bem como algumas figuras como o passo suspenso, usado para provocar o touro, e a reverência, com que agradece os aplausos do público (Gonçalves, 2015: 26).
    A preparação dos cavalos de toureio é imensa, pressupondo grande dedicação da parte do cavaleiro que progressivamente lhe vai fazendo sobressair as suas aptidões numa primeira fase treinado em torno de uma “tourinha” e gradualmente ganhando hábito e confiança para enfrentar touros mansos e bezerras até ao confronto com o touro bravo, perante o qual o cavalo se apresenta no seu esplendor, revelando todas as suas capacidades. No momento de confronto, aos cavaleiros se exige o mesmo registo, de fortes aptidões para além de outras características como agilidade, desembaraço e equilíbrio sobre a sela, assim como bastante flexibilidade para suportar todas as investidas na frente do touro.
    Os mais entusiastas nestas matérias consideram que os cavalos são autênticos toureiros ousando considerar que entendem o touro mesmo antes do cavaleiro, antecipando assim alguns movimentos. Sublinhe-se que uma das grandes virtuosidades do Lusitano é, sem dúvida, a sua prestação em contexto tauromáquico onde demonstra uma coragem e tranquilidade únicas perante o seu perigoso adversário, o qual o cavalo enfrenta ultrapassando o temor e revelando o quanto são necessárias e evidenciadas as características que o singularizam.
    Por fim, referir que a equitação clássica ou erudita faz-se sentir também no traje do cavaleiro o qual tem a sua inspiração no traje palaciano do século XVIII e no luxo da corte de Luís XIV e Luís XV. O traje do cavaleiro manteve-se até aos nossos dias desde o reinado de D. João V, tendo sofrido pouquíssimas alterações. É constituído por tricórnio, casaca de seda ou de veludo bordado, colete, calção bota de cano alto, com salto de prateleira (cf. IV Património Associado).


    Equitação Popular (de campo e/ou lazer)


    «É curioso ver como está enraizada nas camadas populares portuguesas. Oriunda dos salões da nobreza, das cortes mais evoluídas e luxuosas do Mundo, é tão profundamente adotada por todo um povo que se pode ver executar os tão difíceis exercícios como o piaffe e a passage aos campinos e guardas-florestais, aos moços de cavalariça, soldados de cavalaria, etc. a todos quantos tiveram a ventura de vislumbrar algum cultor de equitação em ação…para logo tentar a sua sorte e, em breve, se abalançar a mestre, também» (D’Andrade, Fernando, 2005).


    Trata-se do tipo de equitação mais vulgarizado que abre o leque à existência de um conjunto vastíssimo de praticantes difícil de quantificar e qualificar. Considera-se, por esse motivo, o seu carácter «popular» comparativamente com formas de equitação – «erudita» e a «tauromáquica» - mais circunscritas e onde mais facilmente se identificam os praticantes, as suas formas de aprendizagem e os seus modos de produção e reprodução.
    Este tipo de equitação de raiz popular contempla práticas equestres variadas em que a matriz comum passa pela relação de contacto, convivência e confiança que se estabelece, despretensiosamente, entre um cavaleiro e o seu cavalo, ou seja, menos sujeita à imposição e sujeição do que qualquer uma das outras modalidades exige, em resultado da necessidade de utilização do cavalo para determinados fins que não apenas o de desfrute.
    Dentro desta categoria consideramos dois tipos de equitação – de campo e de lazer - considerando, desde logo, que entre ambas não existem fronteiras rígidas. Note-se que a primeira está associada ao que se considera ser uma equitação de trabalho no campo (da qual resultou a prática de uma modalidade desportiva) e a outra o resultado de um conjunto de práticas equestres, mais ou menos espontâneas, mais ou menos programadas, mais ou menos exibicionistas que cavaleiros demonstram em determinadas ocasiões de lazer, públicas ou privadas.
    Assim, e se por um lado, a Equitação de Campo é indissociável de uma atividade profissional específica que decorre da existência, em Portugal, de ganadarias e da consequente necessidade de manejo, a cavalo, de gado bravo, a Equitação de Lazer expande-se a todo um universo de fruição ou recreação no domínio equestre que, nem tão pouco, exclui a própria realidade de maneio de gado em contexto recreativo. Note-se que participantes na vigilância do gado e restantes atividades de maneio, nomeadamente criação ou apartação de reses bravas, fazem-no como atividade de lazer, não obstante que outros o façam como atividade profissional.
    Em Portugal a existência de um grupo profissional restrito – os campinos - mantém viva a atividade à qual associamos a Equitação de Campo. É importante sublinhar que no friso cronológico da História, a sua atividade, ou seja, a guardaria do gado, terá sido a razão fundamental pela qual o cavalo foi domesticado. Maiorais de vacas, touros e cavalos em casas agrícolas com tradição taurina, estão disseminados pelo Ribatejo e Alentejo e são figura obrigatória em qualquer festa ribatejana. Esta profissão que ao longo dos anos foi amenizando e atenuando as agruras de outros tempos, conserva ainda hoje conhecimentos ancestrais do maneio do gado a cavalo, transmitidos, na grande maioria dos casos, de geração em geração.
    Facto curioso é que as origens humildes do campino que evocam vidas duras e arriscadas, como a sua afeição ao labor desde tenra idade, fazem deles exímios cavaleiros, por instinto e por hábito e da sua experiência, em nenhum tratado descrita, resulta a capacidade totalmente empírica de conduzir a sua montada a realizar exercícios de equitação clássica quando o momento puxa ao exibicionismo, mostrando como um homem humilde da lezíria também domina os ares de escola. Esta é uma particularidade muito característica da vida rural portuguesa e tem as suas origens quando, no fulgor do nascimento das academias equestres, o campino percebe que é capaz de reproduzir, muito pelo cavalo que dispõe, aquilo que vê fazer aos cultores da equitação, aqueles que pelo seu estatuto social, frequentavam tais academias.
    A campinagem não se cruza apenas com a Equitação Erudita, da qual por vezes e inesperadamente, se aproxima, como se cruza com a Equitação Tauromáquica ela própria subsidiária desta via mais clássica ou académica da Equitação Portuguesa o que revela, de facto, que as fronteiras são ténues. No campo lá estão os campinos, acompanhando os cavaleiros profissionais (ou amadores) em algumas ações de maneio nas largadas ou nas praças de touros, às quais, com regozijo, conduzem os touros que veem nascer para serem lidados. Note-se que noutros países, esta equitação de campo é exaltada pela existência de figuras emblemáticas como os gaúchos da América Latina ou os cowboys norte-americanos.
    Esta equitação deu origem à instituição, a nível internacional, de uma disciplina designada por Equitação de Trabalho (ET) que se define como uma modalidade equestre baseada na equitação tradicional de cada país. A disciplina foi concebida no final dos anos 90 (século XX) com a intenção de promover os diferentes tipos de monte utilizados nos vários países, utilizadores do cavalo como meio e instrumento de trabalho de campo. Portugal foi um dos quatro países pioneiros, a par com Espanha, França e Itália, onde nasceu a modalidade. Pretende-se assim conservar e perpetuar, não só o tipo de equitação de cada país, mas também as várias tradições, trajes e arreios que fazem parte do património cultural equestre de cada nação. Note-se que ao nível da Equitação de Trabalho cada país utiliza o seu cavalo sendo que, naturalmente, os portugueses, utilizam o Puro-sangue Lusitano.
    A Equitação de Trabalho surge na sequência do pressuposto que o homem tem utilizado o cavalo desde sempre no contexto da economia rural. Exige-se aos cavaleiros destreza na condução da montada (a qual conduz apenas com uma mão) e ao cavalo se exigem aptidões físicas e morais diferenciadas, para que possam vencer os obstáculos que se apresentam com eficiência e segurança protegendo-se a si e aquele que o conduz. Importa sublinhar que Portugal teve a sua primeira participação no campeonato da Europa de 1997, realizado em Espanha. Desde então cavaleiros e cavalos portugueses, individualmente e por equipas, têm participando nos principais eventos nacionais e internacionais de ET, usando uma vasta maioria de cavalos Lusitanos, com resultados internacionais muito expressivos e relevantes, obtendo frequentemente o título de campeões europeus e mundiais, individualmente ou por equipa.
    Voltemos ao PSL para constatar a sua versatilidade e como ele está efetivamente e liminarmente presente em toda e qualquer manifestação ou prática equestre que compõe a nossa Equitação Portuguesa. Se como cavalo de Alta Escola, o Lusitano se revela uma mais-valia, tal como se revela no toureio ou no trabalho do campo ou ainda em modalidades desportivas, como cavalo de sela e passeio assim se mantém por ser extremamente dócil e participativo. Neste sentido é considerado um cavalo excelente para quem o procura apenas para lazer.
    Com efeito, a questão do lazer remete para todo um universo de utilização do cavalo e da prática da equitação por todo e qualquer cavaleiro, dos mais profissionais aos mais amadores para fins exclusivamente recreativos. Tem sido exponencial o crescimento deste tipo de prática em Portugal o que não pode ser dissociado de um renovado e acentuado entendimento relativamente à noção de lazer e fruição e ao modo como a ocupação dos tempos livres se tem imposto na sociedade moderna. Em Portugal a equitação popularizou-se com essa consciencialização e com a consequente difusão e democratização das formas de acesso ao mundo equestre que até há uns anos pertencia a uma esfera restrita, circunscrita a determinados círculos sociais.
    No panorama atual considera-se que este tipo de equitação não está associado a qualquer atividade ou grupo social porque nele se inscreve toda e qualquer experiência equestre que indivíduos desenvolvem para fins de ocupação dos seus tempos livres e que decorre, por norma, de uma motivação pessoal do cavaleiro e de uma clara intenção de desfrutar, nesses momentos, da companhia do cavalo, aprimorando-se gradualmente na forma de o conduzir e de nele se apresentar. Os valores emocionais são aqueles que prevalecem neste tipo de relação, despretensiosa, que se estabelece entre um cavaleiro (independentemente do seu nível de desempenho) e a sua montada não sendo incomum que tais valores se estendam, neste fenómeno que não é isolado, à intenção de desfrutar da natureza, da vida no campo e do convívio em ambientes relaxantes e descontraídos que a ação de “montar a cavalo” pode proporcionar a todos aqueles que a desenvolvem fora do contexto citadino.
    Todo este enquadramento se manifesta num conjunto de práticas sociais e culturais que decorrem num determinado tempo/espaço social, em círculos mais ou menos acessíveis. Falamos de um universo de festas, feiras e romarias onde esta prática equestre de lazer é mais visível e mais acentuada, com maior ou menor grau de participação e intervenção individual e coletiva de cavaleiros e que tem, por todo o país, enorme representatividade.
    São conhecidas as festas ribatejanas que decorrem entre os meses de março e outubro e onde as atividades taurinas se sobrepõem às atividades equestres. Presença obrigatória e indispensável em qualquer festa ribatejana, a figura do campino é símbolo da Festa Brava, que alia o touro ao cavalo e que, como tal, também não dispensa a arte do toureiro através da realização de inúmeras corridas de touros que nestas localidades e por estas ocasiões festivas, se realizam.
    Inscrevem-se também neste contexto festivo, recreativo e ritual, as romarias equestres, como a recém-criada Romaria de S. Martinho na Golegã, a Romaria de Nossa Senhora de Alcamé em Vila Franca de Xira ou a Romaria a Cavalo Moita - Viana do Alentejo recuperada em 2001 após 70 anos de interregno e na qual participaram, em 2017, mais de 300 cavalos e centenas de cavaleiros. Apesar do caráter religioso que está na sua génese, estes eventos assumem hoje uma vertente lúdica, de lazer que move grande parte daqueles que participam. Marcam presença nestas romarias ilustres cavaleiros das mais variadas proveniências, desde cavaleiros tauromáquicos e sua rede familiar, cavaleiros representantes de casas agrícolas/coudelarias, cavaleiros praticantes de modalidades desportivas, campinos e um sem número de outros cavaleiros participantes, dificilmente qualificável, que têm a equitação como ocupação profissional e/ ou de tempos livres e que, por estas ocasiões se lhes permite praticar e exibir o seu desempenho na condução da montada.
    São cada vez mais comuns e participados outros eventos realizados em contexto rural, em que atividades taurinas e equestres se mesclam e onde a presença de público se tem intensificado. São conhecidas também as festas de campo e delas são exemplo as organizadas na Quinta da Brôa, na Golegã ou as Feiras de Campo organizadas na Herdade da Torrinha, em Coruche, pertença da família Ribeiro Telles. Nelas se realizam, como sucedeu em 2017 na Torrinha, espetáculos equestres e taurinos, demonstrações de maneio de gado, pastoreio e falcoaria, exposições sobre a vida rural, gastronomia e artesanato, fados e apresentações folclóricas que decorrem em pleno cenário da charneca ribatejana e onde marcam presença milhares de participantes, entre centenas de cavaleiros que por esta ocasião exibem a sua arte equestre.
    Associado a este contexto e reduzindo o foco desde as iniciativas totalmente acessíveis, como a participação aberta a qualquer um nas festas ribatejanas ou nas feiras de campo, passando para um contexto um pouco mais circunscrito das Romarias, acessível àqueles que se tornam “romeiros”, alcançamos o patamar das iniciativas que são verdadeiramente mais circunscritas e menos acessíveis. Trata-se de iniciativas particulares, desenvolvidas em contexto familiar ou promovidas através de redes de socialidade restritas que decorrem nas casas agrícolas, ganadarias e/ou coudelarias e onde família e amigos mais próximos se reúnem de forma intimista em torno de algumas atividades lúdicas taurinas e/ou equestres e onde, entre si, partilham descontraidamente as suas exibições reunindo touros e cavalos ou, tratando-se por exemplo, de passeios ao ar livre, disfrutando em conjunto a relação com o cavalo e com a natureza.


    Outras realidades


    Como referido, a Equitação Portuguesa que é objeto do presente pedido de inventariação, é apenas uma parte da equitação que se pratica em Portugal. É desenvolvida por determinados grupos e indivíduos e tem no Puro-Sangue Lusitano a raça, entre todas as outras, mais apropriada para a sua realização. Assim sendo, considera-se pertinente, em associação ao presente pedido de inventário, a referência às restantes três raças de cavalos portugueses, cada uma com a suas especificidades e práticas associadas, as quais, uma vez autónomas, se podem igualmente propor a inscrição no Inventário Nacional do Património Imaterial. Referimo-nos às raças: Sorraia, Garrano e Pónei da Terceira. Nem todas têm a mesma projeção e algumas enfrentam graves problemas de extinção.
    O Cavalo do Sorraia, por exemplo, encontra-se em risco uma vez que a sua população é hoje muito reduzida existindo somente em locais onde se procede à criação e manutenção da raça. A sua designação deve-se precisamente ao facto de ter sido recuperada pelo Dr. Ruy d’Andrade, em 1920, a partir de um núcleo de animais identificados na região de Coruche, no vale do rio Sorraia. A importância desta raça, e a correspondente necessidade de proceder à sua salvaguarda decorre da sua própria antiguidade histórica. Animais do tipo morfológico que atualmente corresponde ao Cavalo do Sorraia encontram-se representados em pinturas paleolíticas do sul da Península Ibérica o que leva a considerar que representa um tipo de cavalo ibérico primitivo o qual terá sido domesticado. A sua seleção e melhoramento terá estado na origem do cavalo de sela ibérico (incluindo as raças Puro-Sangue Lusitano e Pura Raça Espanhola) e, por influência destas, a grande maioria das raças de cavalo de sela do mundo. Relativamente à raça Garrana, considera-se relevante incluir, como manifestação associada, uma prática equestre ancestral designada como “Passo Travado” que lhe está associada. Característica da equitação tradicional do Noroeste de Portugal e da vizinha Galiza, este tipo de equitação, de “passo travado”, é praticada um pouco por todo o mundo havendo raças especializadas na sua execução, nomeadamente o Mangalarga Marchador que é a maior raça equina do Brasil e que tem as suas origens no cavalo de Portugal, nomeadamente nos cavalos Alter-Real e Garrano.
    O “Passo Travado” está efetivamente muito associado ao Cavalo Garrano e à equitação tradicional que se pratica nas regiões serranas do Minho e Trás-os-Montes. O Garrano é um cavalo pequeno, de sólida estrutura física e com características muito próprias que conserva desde há milhares de anos. Devido à sua robustez e capacidade de adaptação habita nas regiões montanhosas onde ainda são criados num regime semisselvagem. Esta adaptação ao habitat de montanha conferiu-lhe, ao longo de séculos, especial aptidão para o transporte de pessoas e mercadorias em áreas de morfologia acidentada, tal como se revelou um precioso auxiliar nos trabalhos de tração e lavoura no sistema agrícola de minifúndio característico daquela região do país.
    Para além dos três andamentos naturais - passo, trote e galope – e à semelhança de outros pequenos cavalos e póneis, apresenta mais dois andamentos: andadura e o “passo travado”. Designado pelos romanos como numeratim (números contados, um, dois, três, quatro), o “passo travado” é intermediário entre o passo e o trote, ouvindo-se quatro batidas, muito precipitadas e aproximadas por fases diagonais. As oscilações verticais do centro de gravidade são muito fracas embora os movimentos do cavalo sejam bastante rápidos, proporcionando uma grande comodidade ao cavaleiro.
    Este tipo de equitação - de “passo travado” - praticava-se, como referido, um pouco por todo o Norte de Portugal, “desde a Galiza até Coimbra. Constituindo (…) uma prática equestre de origem popular, surge escassamente caracterizada nos tratados de equitação. São raros os documentos históricos que chegaram até à atualidade onde esta forma equestre seja descrita”. (Câmara Municipal de Viana do Castelo, 2018). Ao “Passo Travado” e ao cavalo Garrano está associado todo um património, natural, genético, zootécnico, bem como histórico-cultural e imaterial que se pretende preservar e valorizar. Assim, e considerando o risco de perda deste inestimável património foi lançada, em 2009, uma proposta de Candidatura do cavalo Garrano a património nacional propondo-se “contribuir para a manutenção de um recurso biológico insubstituível integrando, num conceito holístico, perspectivas produtivas, genéticas, ambientais, sociais e culturais, evitando a tendência regressiva de uma raça autóctone e reforçando o orgulho e a identidade de um povo." (Nuno de Vieira e Brito, Coordenador da Candidatura do Garrano a Património Nacional, in http://garrano.ipvc.pt/)

    Por fim, destacar a importância da quarta e mais recente raça de cavalos em Portugal. Foi em 2017 que o Pónei da Terceira foi reconhecido como raça autóctone. Como o próprio nome indica, é uma raça açoriana, mais concretamente da ilha Terceira. O Pónei da Terceira distingue-se por ter as dimensões de um pónei, mas as características morfológicas de um cavalo. Por isso considera-se que é o cavalo ideal para o ensino de equitação entre as classes mais jovens. Para os promotores que lideraram o processo de reconhecimento desta raça, mais do que garantir a sua sustentabilidade, esse reconhecimento vem também salvaguardar um património transmitido por gerações anteriores. Considera-se que o cavalo foi parte importante do quotidiano dos terceirenses, como animal de trabalho, o qual ajudou inequivocamente a contribuir para o desenvolvimento da ilha.
  • Manifestações associadas:
    Indissociavelmente ligada à Equitação Portuguesa está a Feira de São Martinho a qual conta com mais de quatro séculos de existência. Recorde-se que o rei D. Sebastião a decretou por alvará a 6 de julho de 1571. A Feira desde sempre desempenhou um importante papel no desenvolvimento da Golegã sendo que no século XVIII era apresentada na Aula do Comercio (primeiro estabelecimento de ensino técnico profissional oficial do mundo criado em 1759, em Lisboa, por Marquês de Pombal) como uma referência no âmbito da sua importância para a economia nacional. Marcada por períodos de maior e menor fôlego a Feira de São Martinho chega às primeiras décadas do século XXI como um dos eventos mais emblemáticos e de maior representatividade no panorama equestre nacional e provavelmente internacional sendo que para ali convergem todos os amantes dos cavalos e os guardiães e detentores da Arte Equestre Portuguesa em todas as suas dimensões.
  • Contexto transmissão:
    Estado de transmissão activo
    Descrição: Estado:

    A transmissão da Equitação Portuguesa está ativa e disseminada por todo o território nacional. Processa-se basicamente sob a forma oral, de mestre para aluno/cavaleiro. Pese embora o binómio transmissão-aprendizagem seja mais comummente associado ao trabalho desenvolvido pelos centros equestres nos quais a prática e o ensino da equitação é regular, mantém-se igualmente viva por via da tradição familiar nas coudelarias portuguesas e casas agrícolas onde subsiste a transmissão intergeracional da prática equestre. Do mesmo modo a EPAE veio, após a sua criação em 1979 tornar mais efetiva a sua transmissão através da formação e aperfeiçoamento dos cavaleiros até atingirem a mestria desta arte.


    Descrição:

    A arte de montar a cavalo portuguesa põe em destaque a harmonia entre o cavalo e o cavaleiro e entronca nos ensinamentos que foram sendo passados sobretudo através dos picadores da academia equestre, denominada Real Picaria. Posta de parte a utilização do cavalo para fins de guerra, a equitação artística sobreviveu, um pouco por toda a Europa, como uma equitação de corte, onde o ensino da equitação académica se enraizou e donde irradiou. Mesmo o Colégio dos Nobres, na Cotovia, em Lisboa, do qual subsiste precisamente o seu picadeiro, com uma notável arquitetura ao nível da realização da estrutura da cobertura, ministrava o ensino da equitação. E é basicamente a partir dessa irradiação da arte da cavalaria que chegou aos mestres atuais.
    A linha de transmissão desde os fins do século XIX e princípios do século XX, aquando do fim do regime monárquico e a implantação da República, é por demais evidente: o mestre Nuno Oliveira recebe os seus ensinamentos do seu tio, o Mestre Joaquim Miranda, um dos últimos picadores da casa real. O Mestre-Picador Luís Valença é discípulo de Nuno Oliveira e igualmente a quem chama “o último picador real”, D. José Manuel da Cunha Menezes e de D. Diogo de Bragança, exímio equitador e destacado bibliófilo da arte equestre, que reuniu um importante acervo impresso que hoje enriquece o espólio do Palácio Nacional de Queluz. O Dr. Guilherme Borba foi também discípulo do Mestre Nuno Oliveira e é ele, em conjunto com um grupo de cavaleiros e personalidades do mundo equestre, que funda a Escola Portuguesa de Arte Equestre, para reconstituir com a maior fidedignidade a prática da Picaria Real. No universo dos cavaleiros e praticantes reconhecemos em regra que, de algum modo, através de outros mestres, entroncam nessa linha de prática de uma equitação clássica, que está bem plasmada em Portugal desde o século XVII. O ensino do cavalo em alta-escola, tal como hoje se pode apreciar na execução dos andamentos e manobras mais simples, até aos ares altos, apesar de entroncar na equitação clássica europeia, apresenta características diferentes, na lide com o touro no campo e em arena ou nos jogos equestres.
    O conjunto de praticantes da Equitação Portuguesa, que conta mesmo com centenas de apresentações internacionais, só nas últimas duas décadas, tem irradiado os seus ensinamentos por centros equestres e picadeiros. O caso e história da prática de Luís Valença é representativo. Os princípios da prática da Equitação Portuguesa são-lhe transmitidos por equitadores e mestres cuja prática entronca na linha que vem desde os antigos cavaleiros herdeiros da equitação praticada na academia equestre da Casa Real portuguesa, sendo estes conhecimentos aplicados ao longo da sua carreira, como equitador e mestre da Escola Portuguesa de Arte Equestre, desde a fundação, em 1979, até aos nossos dias. Apoiou o Mestre Nuno Oliveira na criação do Picadeiro da Malveira, elaborou um “projeto de criação do Centro de Equitação e Formação em 1974, que não chegou a operar devido aos tempos conturbados pós-revolução de Abril, mas este projeto foi de facto a génese do Centro Equestre da Lezíria Grande, em Povos, Vila Franca de Xira, que goza hoje da melhor reputação como centro de excelência da prática e ensino, de cavaleiros e cavalos, mesmo para além fronteiras, sendo habitual a presença de Luís Valença e dos seus discípulos em apresentações nos quatro Continentes. A procura dos seus ensinamentos tem tido um crescente desenvolvimento, quer por cavaleiros nacionais, quer por cavaleiros estrangeiros interessados na prática da equitação clássica e no Cavalo Lusitano.
    Factualmente são bem representativos, para além dos equitadores e mestres da EPAE, os cavaleiros dos centros equestres, como o da Lezíria Grande (CELG), do referido mestre Valença. O centro Santo André Lusitanos (STAL), na Póvoa de Santo Adrião, opera sob a direção de António Borba Monteiro, professor de equitação clássica. Foi discípulo de seu tio Guilherme Borba, um dos fundadores e primeiro diretor da EPAE, foi Mestre da EPAE, onde permaneceu desde 1998 a 2018, e nesta Associação fundada em 2002 (STAL) promove “a nível nacional e internacional a prática da equitação académica de raiz portuguesa”.
    Importa realçar que o Picadeiro e instalações da Qta. de St. André detém um historial de mais de seis décadas ligado a Nuno de Oliveira e Guilherme Borba, que foram seus proprietários e aí praticavam equitação reputados cavaleiros como D. Diogo de Bragança, o Professor de medicina Celestino da Costa, além do seu atual proprietário António Borba Monteiro. Foi e continua a ser um local de culto da Equitação Portuguesa para portugueses e estrangeiros que conta com a participação de Miguel Bragança, ex-equitador da EPAE, atualmente adjunto da direção da STAL. Este equitador desenvolve continuadamente trabalhos em articulação com a APSL nomeadamente para a definição do Regulamento do Concurso de Equitação Portuguesa.
    A transmissão da Equitação Portuguesa assenta nos saberes e os conhecimentos associados à arte equestre e transmitem-se consoante os (diversos) contextos em que a sua prática decorre. O lado mais visível desta transmissão e o mais facilmente identificável é o que decorre efetivamente do ensino e da formação que é conduzida nos centros equestres. Nestes locais o trabalho dos mestres, instrutores ou monitores de equitação garante processos de aprendizagem individuais e personalizados que se adaptam aos interesses de cada indivíduo seja para fins exclusivos da prática da Equitação de Lazer, seja na prossecução de objetivos mais ambiciosos que pressuponham, por exemplo, a prática da equitação enquanto modalidade desportiva.
    Note-se, por exemplo, o trabalho que desenvolve a Guarda Nacional Republicana (GNR) através das Escolas de Equitação da Unidade de Segurança e Honras de Estado (USHE) de Braço de Prata e da Ajuda, que disponibilizam lições com o objetivo de proporcionar aos jovens o contacto com o meio hípico e o cavalo, como iniciação, a aprendizagem e o aperfeiçoamento da Equitação e ainda a prática de Hipoterapia ou Equitação Terapêutica a cidadãos portadores de deficiência. As aulas funcionam fora das horas de serviço e constituem uma rentabilização dos recursos desta Instituição. Do mesmo modo, de referir o trabalho que desenvolve a Escola de Equitação da Sociedade Hípica Portuguesa, uma academia que adota uma abordagem pedagógica que promove a excelência na prática da equitação e a paixão pelo cavalo através de um sistema de ensino formal que pressupõe aulas práticas e teóricas e, inclusive, a realização de exames e apresentações públicas. Neste caso específico a evolução dos cavaleiros é baseada nos níveis previstos pela Federação Equestre Portuguesa (FEP), da sela I à sela IV e o programa baseado no Manual Oficial da Formação Equestre destinado à formação equestre, tanto de praticantes como de profissionais docentes. As lições dividem-se entre aulas práticas onde os iniciados aprendem por exemplo, e no caso da modalidade mais básica (sela I): a manter o equilíbrio e desenvolver a ligação ao movimento nos três andamentos; o trote levantado; a transitar entre os andamentos; a conduzir sobre voltas largas e a executar as figuras básicas de picadeiro a passo e a trote. No caso das aulas teóricas e exemplificando ainda neste nível, os alunos aprendem a conhecer os arreios e as suas componentes; a conhecer os diferentes instrumentos de limpeza; a conhecer as figuras de picadeiro; a conhecer as regiões exteriores do cavalo (elementar) e a conhecer as pelagens mais comuns. Neste caso, os praticantes podem evoluir para a prática do hipismo e completar os restantes níveis de formação. De sublinhar que muitos destes instrutores, possuem certificação como Treinadores pelo Instituto Português do Desporto e Juventude.
    Cumpre dar nota de que a Escola de Equitação do Centro Militar de Mafra, nascida para formar os seus quadros (militares), veio disponibilizar à sociedade civil formação ao mais alto nível de cavaleiros na Equitação Desportiva/Competição, o que inclui o ensino dos ares de escola apropriados a esse contexto – a Equitação Superior. Contudo não existe, em Portugal uma escola ou uma academia formalmente constituída que se dedique ao ensino da equitação académica fora do contexto desportivo.
    A Escola Portuguesa de Arte Equestre tem-no como um dos seus fundamentos, contudo, o ensino é apenas uma aspiração, ainda não consumada formalmente. Os cavaleiros da EPAE chegam à Escola com um nível de formação prévio bastante elevado, sendo essa condição sine qua non para o ingresso. Vão progredindo ao longo da carreira através de categorias hierárquicas (Aluno, Aspirante, Picador-Ajudante, Picador, Mestre-Picador, Mestre-Picador Chefe) à medida que o seu nível de especialização se vai acentuando. Da prática decorre grande parte da sua especialização. É importante sublinhar que uma vez mais que alguns centros equestres disponibilizam aulas ao estilo das academias clássicas. Conhecendo-se a existência de vários, considera-se emblemático o Centro Equestre da Lezíria Grande, do qual é proprietário o Mestre Luís Valença, ex-cavaleiro da EPAE e discípulo do consagrado Mestre Nuno Oliveira, pelo facto de o Centro estar vocacionado não apenas para o ensino regular mas também para a realização de espetáculos de Alta Escola pelo que frequentemente incorpora os seus alunos-praticantes nesta missão que desenvolve em Portugal e, sobretudo, no estrangeiro. Trata-se de um tipo de ensino tratadista que, tal como sucede na Escola Portuguesa de Arte Equestre, privilegia a doutrina da equitação clássica que mantém os ensinamentos inspirados na obra "Luz da Liberal e Nobre Arte da Cavalaria" de Manoel Carlos de Andrade.
    Relativamente a este contexto e nomeadamente em relação à Escola Portuguesa de Arte Equestre há que destacar um facto importantíssimo que se revela no modo como continuada e regularmente, há mais de quatro décadas, os seus cavaleiros (e ex-cavaleiros) tem vindo a promover o ensino e a transmissão dos conhecimentos associados à Equitação Portuguesa em Portugal, junto de academias ou centros equestres mas também assinalavelmente além-fronteiras num considerável número de países - Alemanha, França, Itália, Espanha, Tailândia, Suíça, Inglaterra, Canadá, Holanda, Marrocos, África do Sul, Dinamarca, Israel, Suécia, Finlândia, Noruega, Ucrânia, Rússia, Grécia, Brasil, México, Guatemala, Nova Zelândia, Filipinas, China, Austrália, Estados Unidos da América, Dubai, Colômbia, República Checa, Tunísia, Luxemburgo, Escócia, entre outros. Antigos e atuais efetivos da EPAE desenvolvem uma intensa atividade de ensino e formação que transcende as nossas fronteiras e que revela um interesse crescente pelo Cavalo Lusitano e pela equitação que ele proporciona e que se torna também evidente, por exemplo, na Feira de São Martinho na Golegã cada vez mais procurada por estrangeiros amantes do nosso Cavalo e da nossa Arte Equestre. Para além do próprio Luís Valença distinguimos cavaleiros que já não estão no ativo, os já falecidos João Trigueiros de Aragão, José Atayde, Guilherme Borba e Filipe Figueiredo “Graciosa”, bem como António Borba Monteiro, Carlos Pinto, Daniel Pinto, Jorge Pereira, Miguel Atayde, Miguel Anacoreta, Miguel Ralão, Rodrigo Matos, Pedro Torres, Nuno Palma Santos, Francisco Cancela de Abreu, Joaquim Salvador, Frederico Cardoso, Gonçalo Carvalho e Paulo Sérgio - e aqueles que o fazem atualmente ainda como efetivos da EPAE: João Pedro Rodrigues, Francisco Bessa de Carvalho, João Quintas, Vasco Gaiolas Pinto, Rui Almeida e Gonçalo Soares.
    Relativamente ao cavaleiro tauromáquico, este “bebe” fundamentalmente deste tipo de ensino, clássico e académico, sendo que a sua formação, para além de uma forte componente prática que é adquirida com a experiência passa, ao longo da sua carreira, pelo domínio deste tipo de equitação erudita que aplica, aos olhos dos mais conhecedores, na sua prática tauromáquica. Os saberes e os conhecimentos são-lhe transmitidos, formalmente, por mestres qualificados que dominam os métodos e a doutrina da equitação clássica.
    Um campino, a quem as condições de vida não permitem a aprendizagem formal de qualquer doutrina académica, aprendem fundamentalmente por jeito natural, por hábito e por imitação. Da sua experiência resulta a capacidade totalmente empírica – e curiosa - de conduzir o seu cavalo a realizar exercícios de equitação clássica quando o momento puxa ao exibicionismo. Talvez em nenhuma outra manifestação da Equitação Portuguesa a transmissão e o ensino seja tão empírica e intuitiva como no caso do campino que aprende a montar sem formalismos com aqueles que, na sua família e antes de si, ao mesmo ofício se dedicaram e da mesma forma aprenderam.
    Por fim, a questão da transmissão intergeracional que no caso anterior é explícita, decorre num outro contexto associada ao modo como, nas famílias tradicionais de criadores de cavalos, a prática da equitação se revela ela própria intergeracional e resulta de saber acumulado entre muitíssimas gerações. Tomemos como exemplo o caso da família Veiga, da Coudelaria Veiga, na Golegã, fundada há mais de 200 anos que, para além do inestimado contributo para seleção da raça Puro-sangue Lusitano a família presta também um contributo à Arte Equestre Portuguesa pela forma como, ao longo dos anos tem conservado e transmitido, no seio familiar os seus conhecimentos na arte de montar e dominar o cavalo. O caso também, e ainda a título de exemplo, da família Sommer d’Andrade e da Coudelaria fundada em 1894 por Ruy d' Andrade que a partir de então, e por gerações, tem criado cavalos e cavaleiros notáveis que se distinguem em quase todas as atividades hípicas, desde os obstáculos, passando pelo ensino e pelo toureio. Destaca-se igualmente pelas mesmas razões que se prendem com a sua relevância, antiguidade e pelo modo como se fazem representar publicamente, a Coudelaria Ervideira, Palha Blanco, Infante da Câmara, Oliveira e Sousa, Menezes, entre outras.
    Consideramos que decorre nestas famílias e em muitas outras que se manifesta impossível nomear, a sincronização entre a paixão pelos cavalos e o modo como ao longo de gerações continuam perpetuando e aprimorando a arte de os montar e que se torna particularmente visível na Feira Nacional da Golegã onde marcam presença, representadas por diferentes gerações de cavaleiros e amazonas. Ao longo dos dias que decorre o evento é possível observar os seus dotes na prática da Equitação Portuguesa, expressos também no modo como trajam e apresentam os seus cavalos na emblemática manga adjacente ao picadeiro do Largo do Arneiro. As principais famílias estão representadas nas “casetas” – espaços privados onde estas famílias se reúnem e recebem convidados - que circundam a manga e que comprovam a sua importância no panorama equestre português.


    Modo(s):

    A transmissão dos conhecimentos associados à prática da Equitação Portuguesa é feita de modo formal e informal. Formal quando o ensino se processa, de forma oral, de instrutores para aprendizes ou para cavaleiros mais experientes com base num programa de formação que é definido pelo Centro onde as lições decorrem e que pode incorporar, como vimos, aulas teóricas associadas às aulas práticas. Dentro deste tipo de ensino formal enquadra-se a transmissão de conhecimentos associados à prática da equitação clássica ou erudita, cujos ensinamentos se baseiam nos métodos codificados na obra, datada do século XVIII, do Picador da Picaria Real Manoel Carlos de Andrade.
    Consideram-se como modos de transmissão informal aqueles que resultam de uma aprendizagem empírica que decorre por instinto, por hábito e por tradição familiar. Nestes casos consideramos um tipo de cavaleiros que domina a arte equestre sem ter tido qualquer base de ensino formal, alçando-se sobre o cavalo e testando nele, ao longo dos anos, as qualidades de ambos.
    Quando os discípulos se encontram já com o domínio do cavalo nos principais andamentos, passo, trote, galope, paragem, recuar, já executam voltas, círculos e figuras no picadeiro mantendo o cavalo direito e alinhado com a sua progressão no terreno executada com naturalidade e descontração, com perfeita submissão às ajudas (indicações) do cavaleiro, o mestre passa ao ensino da execução dos passos de escola mais avançados, sendo o discípulo ensinado a obter uma maior concentração do cavalo, sem perder a impulsão, no passo, no trote de escola e alargado, taralhando sobre a cadência dos movimentos dos membros do cavalo e o seu equilíbrio dinâmico natural, em conjunto com a figura e posição em sela do cavaleiro.
    O emprego das ajudas – mãos e pernas, e o movimento da massa do corpo do cavaleiro – é aperfeiçoado até à sua maior discrição e suavidade, levando à descontração e concentração do cavalo, que o vai naturalmente levar à execução da passage, piaffe, recuar, transições passo / galope /trote / paragem / recuar, evoluindo até à realização das passagens de mãos a galope, primeiro a dois tempos e depois a tempo.
    Daqui resulta uma manobrabilidade graciosa e equilibrada, rápida e descontraída, com equilíbrio e à vontade.
    Estes ensinamentos aplicam-se na execução da tradicional arte equestre portuguesa e perpassam para a arte de tourear a cavalo, que tem na Equitação Portuguesa a sua base, ainda que recorrendo ao improviso e à resposta rápida e destemida do cavalo e cavaleiro, no que Luís Lupi considera ser condição de “virtuosismo inato” necessário à prática desta atividade de lide do touro bravo.
    Um misto entre a transmissão e aquisição de conhecimentos de modo formal e informal é o que decorre do trabalho e da experiência de um cavaleiro que pratica o toureio equestre e que lhe é exigido, pelo público, um domínio aprimorado da arte equestre que procura nos ensinamentos tratadísticos, logo, no ensino formal e que acumula com a aprendizagem empírica, resultante experiencia que ao longo dos anos vai acumulando por força do desempenho e das exigências da sua atividade.

    Data: 2020/05/07
    Modo de transmissão oral
    Idioma(s): Português
    Agente(s) de transmissão: Todos aqueles que se dedicam a transmitir os conhecimentos e saberes associados à utilização do cavalo a qualquer aspirante ou praticante da Arte Equestre Portuguesa
  • Origem / Historial:
    1. Cavalo Lusitano - «o cavalo de sela mais antigo do mundo» e a Arte Equestre Portuguesa

    A história da Arte Equestre Portuguesa é indissociável da história do cavalo, em concreto do Cavalo Lusitano, tal como hoje o conhecemos, Ibérico ou Peninsular que desde tempos mais antigos sempre viveu e conviveu com os nossos antepassados.
    No século XII os combates resolviam-se pela maior força de choque constituída por cavaleiros que, revestidos a ferro tal como os cavalos, se disponham em pé sob os estribos e carregavam sob o inimigo de lança em riste. A estes cavaleiros era-lhes exigido apenas que andassem para a frente e a direito pelo que a esta forma de montar, dita “à brida”, se associa uma rudimentar ou mesmo nula equitação. Se isto era assim na Europa além Pirenéus, na Península verificava-se uma outra realidade, pois que aqui, por razões várias, o cavalo era usado em combate de outra maneira, a equitação “à ginete”. Segundo alguns autores (Costa Ferreira, 2005), o montar “à gineta” terá sido introduzido na Península Ibérica pelos “árabes” no século XII com a introdução de um arreio com arção traseiro muito elevado, de perfil reto, que permitia ao cavaleiro, estribando muito curto, elevar-se para melhor arremessar ou esgrimir a lança sem nunca perder o equilíbrio. Não se pode considerar que tenha mudado a forma de usar o cavalo, mas sim a forma de potenciar o modo como na Península desde sempre se combateu a cavalo. Esta maneira bem diferente de empregar o cavalo passou a obrigar a montar com equitação e consequentemente, a dispor de um cavalo que a permita. Daqui se considera ter nascido a arte equestre.
    Com a evolução da tática militar, a equitação “à brida” ficou ultrapassada pelo que houve então que cuidar da preparação de um novo cavaleiro recuperado para a razão maior da sua existência, o combate. Essa tarefa iniciou-se em Nápoles onde nasceram as academias que desenvolveram as novas técnicas de preparação do cavalo e da equitação tal como hoje a entendemos e que conduziu ao que classificamos como Alta Escola.
    Espalharam-se por toda a Europa as academias equestres onde se passaram a ensinar novas técnicas para que o cavalo se tornasse numa extensão da vontade do cavaleiro. Consequentemente, as Casas Reais, passaram a olhar para nova arte vinda de Itália com mais entusiasmo, por um lado, garantindo o desenvolvimento de uma técnica vital para os seus exércitos e ao mesmo tempo satisfazendo o gosto pessoal de muitos dos seus príncipes e proporcionando à nobreza um novo modo de diferenciação social. Ser cultor de novas técnicas de equitação, possuir capacidade de as evidenciar, possuir conhecimentos e cavalo adequado passaram a ser obrigatórios para quem quisesse honrar os seus pergaminhos. Já não era só a posse do cavalo e de armamento que conferiam distinção, mas também o tipo de cavalo e o modo como era montado.
    As Reais Maestranzas de Caballaria em Espanha (século XVI) e a Picaria Real em Portugal (século XVIII) que tinham na pessoa um Rei um dos mais exímios praticantes, vão promover espetáculos, primeiro palacianos e, mais tarde, públicos, em que demonstravam, para gaudio da população, as capacidades equestres dos seus membros, através de jogos próprios criados para o efeito, sendo que suplantava todos os outros, em termos de entusiasmo do público, o alanceamento de touros (não mais do que brincar com os touros). Note-se que este particularismo, exclusivo da Península, vai impor, sobretudo em Portugal, a manutenção de um tipo de equitação em vias de desaparecimento por toda a Europa.
    Em Portugal, entre 1770 e 1800 a Picaria Real atingiu o máximo esplendor, para o que também foi decisivo o ensino do Estribeiro-Mor, D. Pedro de Meneses, 4º Marquês de Marialva. É também reflexo desse período a edição, em 1790, de “A Luz da Liberal e Nobre Arte da Cavalaria” da autoria de Manoel Carlos de Andrade, Picador da Picaria Real. Com efeito, foi nesta transição, ou seja, quando o montar evoluiu para uma arte, que os tratados de equitação se sucederam. De sublinhar que entre os mais antigos conta-se os dos gregos Simão de Atenas 121 a.C. e o de Xenofonte 371 a.C.. Com um interregno de quase dois mil anos surge, em 1550, o tratado de Grisone e em 1623 é publicada a obra de Antoine Pluvinel "Le Maneige Royal". Cerca de um século mais tarde, François Robichon de la Guérinière publica mais um importante tratado, L’école de Cavalerie (1731).
    É curiosa a história do tratado O Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela, considerado o primeiro tratado de equitação europeu depois da Antiguidade Clássica. Escrito pelo rei D. Duarte presume-se que esteja associado à crise de 1383-85 e de nessa ocasião se ter integrado gente nova na cavalaria portuguesa, agravado pelo facto de na altura se montar de duas maneiras. El-Rei ter-se-á mostrado interessado no melhoramento do desempenho social e militar desses “novos-ricos” e fez assim publicar uma obra que sintetizasse os seus conhecimentos, tornando-os acessíveis e compreensíveis. Os tratados de equitação dos séculos seguintes, nos quais os autores citam frequentemente textos da Antiguidade Clássica, ignoram completamente esta referência. A situação explica-se pelo facto de o rei D. Duarte ter dedicado o livro à sua mulher D. Leonor de Aragão que após a morte do marido (1438) o terá levado consigo quando deixou o nosso país em 1445. Após a morte da Rainha, o livro andou de biblioteca em biblioteca tendo sido localizado, por mero acaso, apenas no início do século XIX (1820) na Biblioteca Nacional de Paris, encapado junto com o Leal Conselheiro, igualmente da autoria do rei D. Duarte. Desta forma, o tratado de equitação jamais atingiu os propósitos para o qual foi redigido o que leva a considerar que jamais a história da equitação passou por ele. De facto, e apesar de algumas referências vagas feitas por cronistas que sabiam da sua existência, nunca ninguém o havia lido até ao século XIX.
    Retomando a questão, há que considerar que o aperfeiçoamento das armas de fogo portáteis e consequentemente das táticas militares vai obrigar, a partir do século XVIII à utilização do cavalo noutros moldes, o que conduz a que a equitação de picaria transite do estatuto de equitação de treino bélico para o de equitação artística e, como consequência, transferindo-se dos cenários bélicos para o contexto dos picadeiros sagrando-se, em Portugal, o principal picadeiro o de Belém (onde se veio a instalar o Museu Nacional dos Coches) entre 1799 e 1807. Pela Europa, a equitação volta-se mais para o domínio desportivo sendo que no nosso país assegura-lhe a continuidade através da prática do toureio equestre que noutros países cedo se desvaneceu e em Portugal nunca se extinguiu.
    A dispensa do cavalo no domínio da guerra foi definitivamente consumada com a I Guerra Mundial e com o triunfo da eficácia do uso das armas ligeiras, como a metralhadora, e o uso das barreiras de arame farpado, inviabilizando o emprego tático da cavalaria na frente de batalha. Os militares vão manter o cavalo como instrumento de preparação dos seus efetivos, incentivando o seu emprego na equitação desportiva, a qual no fundo se caracteriza, grosso modo, por reproduzir dificuldades a vencer pelo cavalo no seu desempenho militar. Note-se que a equitação militar moderna ditou as regras do que veio a ser o desporto federado.
    Em Portugal a situação tem contornos particulares, considerados únicos no mundo. Desde logo o facto de ter sido o último país a dispensar a utilização do cavalo do domínio militar empregando-o ainda durante a Guerra do Ultramar (1961-1974). Por outro lado, em Portugal, o fim da Picaria Real (1807) não representou o fim da equitação académica que em boa verdade não fora uma novidade, como para outros, mas antes uma exaltação da equitação de séculos e séculos da gente lusa. O fim da Picaria Real não teve, por esse motivo, as consequências devastadoras verificadas noutros países. Montava-se agora com mais saber e mais capacidade e aplicava-se ao combate com os touros um grau artístico jamais atingido.
    De facto e aos poucos, com a sua “popularização” e “democratização”, o toureio deixa de ser uma atividade exclusiva da nobreza sendo que surgem profissionais no seio de outros grupos sociais: «A habilidade natural das gentes do campo, habituadas a lidar com o gado durante séculos, por necessidade cavaleiros instintivos desde há gerações e gerações, aliou-se naturalmente a essa “democratização” do toureio equestre, que conciliou uma tradicional e enraizada equitação à gineta com a equitação racional herdada do séc. XVIII e praticada em meios direta ou indiretamente associados à nobreza. Isto fez com que em Portugal sobrevivesse uma equitação exigente e complexa, antiga, de carácter artístico e já não desportivo-militar; e, no entanto, ainda funcional em todo o trabalho ligado ao campo – transporte de pessoas e carga, caça, maneio de gado, vigilância de propriedades – tal como o fora para a guerra. Durante o século XIX e início do século XX, esta equitação sobrevive, portanto, ininterruptamente através da tauromaquia e também pela mão dos últimos picadores da monarquia portuguesa e das casas senhoriais, herdeiros de Marialva e muitas vezes também eles próprios exímios toureiros, apesar das novas modas.» (Gonçalves, 2015: 21-22).


    2. Feira de São Martinho | Feira Nacional do Cavalo

    A Feira de São Martinho na Golegã é uma tradição na actividade equina e equestre que tem servido ao longo de séculos como mostra do Cavalo Lusitano e da Equitação Portuguesa. Conta com quase quatro séculos e meio de existência posto que o rei D. Sebastião decretou, por alvará datado de 6 de julho de 1571, que se realizasse a 11 de novembro, dia de S. Martinho.
    Muito popular e concorrida desde essa altura, na época pombalina a Feira da Golegã estava entre as três mais importantes do país: «No Reyno de Portugal há 136 Feiras anuaes que se fazem em diferentes cidades e vilas; as mais selebráveis são as de vizeu, golega e evora.» (Macedo, Jorge Borges de cit. in Oliveira, 2006: 16).
    No século passado, por finais dos anos 40, com o dinamismo do pós-Segunda Guerra Mundial a Vila da Golegã sofreu alguns melhoramentos e encetou uma nova fase de progresso o que se verificou na própria dinamização da Feira que conheceu um momento de viragem muito em parte provocado também pela expansão do uso do automóvel que, apesar de acarretar a redução drástica do uso de animais para efeitos de transporte, veio proporcionar a facilidade e o aumento da mobilidade o que se repercutiu na afluência à Feira de São Martinho. Com efeito, o que se perdeu em termos de negócio de gado, ganhou em termos de afluência turística o que se veio também a repercutir no incremento de uma economia especializada assente numa atividade de prestígio que sempre esteve presente neste contexto, mas que por esta ocasião se incrementou. Ciente desta questão e perante a evidência de se confirmarem em 1947 cerca de 8000 automóveis na Golegã em novembro, por ocasião da Feira, a Autarquia decidiu encetar algumas obras de melhoramento na Vila. O progresso e o sucesso da Feira mantiveram-se ao longo dos anos 50 sendo que, em 1965, alguns locais denunciavam uma Feira da Golegã “confrangedoramente desatualizada” reivindicando um “sopro renovador” (Martins Ferreira cit. in. Oliveira, 2006, 162). Os anos 70 marcam uma etapa importante deste percurso histórico pelo facto de em 1972 a Feira de São Martinho passar a designar-se como a Feira Nacional do Cavalo por determinação dos poderes públicos, local e nacional. Nesse ano marcou presença na Feira o Presidente da República, Almirante Américo Thomaz que havia visitado a Feira em 1967. A nova denominação veio promover a singularidade da Feira, assente na figura do cavalo, e atribuir uma distinção maior aquela que chegou a ser considerada o «Chiado do Ribatejo» por para ali se transferirem sazonalmente parte da elite social e económica da capital (Oliveira, 2005).
    Por ocasião da Revolução do 25 de abril de 1974 e em resultado da agitação política e social vivida um pouco por todo o país, a Feira Nacional do Cavalo foi temporariamente suspensa, mantendo-se a Feira de São Martinho. Pese embora fosse reconhecido que dissociar a figura do cavalo e a sua conjuntura, da Feira, seria banalizá-la, a questão não foi naturalmente alheia às questões ideológicas subjacentes ao facto de o evento estar conotado com um certo elitismo e de frequentemente ter recebido elementos representantes do anterior regime, sobretudo nos anos antecedentes. Nesse ano de 1974 embora não tivessem sido proibidos de comparecer à Feira de São Martinho, os criadores de cavalos foram proibidos sim, de ostentar os seus ferros.
    A Feira Nacional do Cavalo viria a ser retomada em 1977. Na história recente constata-se que a Feira de São Martinho/Feira Nacional do Cavalo e a Vila em geral sofrem um impulso a partir da segunda metade dos anos 90 com o Executivo liderado por médico e criador de cavalos José Veiga Maltez que assumiu a presidência da Autarquia entre 1997 e 2013. Para além de alguns melhoramentos que vieram renovar a imagem da Vila, é durante o seu mandato que a Golegã se vai assumir definitivamente como a Capital do Cavalo reforçando a sua projeção a nível nacional e internacional. Entre outras ações/iniciativas conta-se a integração da Golegã na Rede Euro Equus, associação europeia que une cinco cidades Capital do Cavalo – Golegã (Portugal), Jerez de la Frontera (Espanha); Waregem (Bélgica); Pardubice (República Checa) e Wroclaw (Polónia).
  • Direitos associados :
  • TipoCircunstânciaDetentor
    Direitos consuetudinários e legais referentes à vigência de Regulamentos sobre a Equitação.Direitos consuetudinários e legais referentes à vigência de Regulamentos sobre a Equitação.
  • Responsável pela documentação :
    Nome: João Costa Ferreira; Gonçalo Couceiro; Carla Queiroz
    Função: Equipa responsável
    Data: 2020/05/07
  • Fundamentação do Processo : ver fundamentação do processo
Direção-Geral do Património Cultural Secretário de Estado da Cultura
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